terça-feira, 20 de outubro de 2009

IOF is back, dear investor

Um mês atrás eu escrevi aqui que Lula e o PT estão aproveitando o momento de relativa calmaria e o sucesso do "modelo brasileiro" durante a crise como argumentos para aumentar a influência econômica do Estado. Se alguém tinha dúvidas sobre essa postura, creio que essas acabaram ontem. Mantega, o çábio, anunciou, após o fechamento do mercado, que a entrada de capital estrangeiro para investimentos em bolsa e renda fixa será taxada em 2% (via IOF). A medida, palavras do governo, visa afastar o capital especulativo, de curto prazo. Praticamente ao mesmo tempo, o ministro de Minas e Energia disse que o governo pode aumentar os impostos do setor de mineração, incluindo o sobre a exportação de minério.

A volta do IOF para estrangeiros (a alíquota tinha sido reduzida a zero há poucos anos) visa, supostamente, conter a apreciação do real contra o dólar (as eleições do ano que vem estão chegando... hora de tentar agradar os exportadores). Começa errando na identificação do alvo: primeiro, porque não é um "problema" específico do real. Praticamente todas as moedas relevantes do mundo estão ganhando contra o dólar. Segundo, as moedas de países produtores de commodities, não por acaso (o clima é de recuperação da economia global, esteja correto ou não), são contra as quais o dólar mais se desvalorizou no ano: real, 35%; dólar australiano, 31%; dólar neozelandês, 30%; coroa norueguesa, 25%; rand sulafricano, 30%. Dessa maneira, qualquer medida local pode, no máximo, atenuar o "problema": se a tendência global do dólar não for revertida (o que, talvez, esteja perto de acontecer, evidentemente por motivos que fogem totalmente do controle do governo brasileiro), o real vai voltar a se valorizar, apenas de um patamar diferente.

Ainda sobre o IOF: se a medida foi tomada efetivamente para afastar o capital de curto prazo, essa distinção deveria ser feita nas alíquotas do imposto: em muitos países, há uma tabela de imposto regressivo, de acordo com o tempo entre o investimento e o seu resgate (e o imposto é cobrado sobre os ganhos de capital, e não sobre o montante total investido). Da forma que foi feita, não há distinção: todos pagam igual, na entrada. A justificativa do governo, nas palavras do çábio: "Se a aplicação for de curto prazo, essa tributação será forte. Por outro lado se a aplicação for de longo prazo, acima de um ano, essa tributação se dilui no tempo, praticamente desaparece". Percebam a arrogância (ou a ignorância) por trás desse argumento: é óbvio que quem investir no Brasil no longo prazo vai ganhar muito, logo os 2% não farão a menor diferença. Olhando para o tamanho dos movimentos da bolsa, pode até parecer pouco; mas, no mundo da renda fixa (pelo qual o Tesouro se financia), onde os movimentos são de décimos de ponto percentual, é uma enormidade.

Por fim, notem que Lula tinha negado as intenções do governo de retomar o IOF para estrangeiros na última sexta-feira. Ou informações não chegam em Cabrobó-PE (onde ele estava), ou ele mentiu. Ontem Mantega disse que havia convencido o presidente naquele mesmo dia, afirmação que provavelmente tem tanto valor quanto uma nota de três reais ou a palavra de um político. Mantega, como sempre, só fez o papel de boi de piranha, e, como de costume, foi o escolhido para anunciar uma medida impopular (nessas horas, dona Dilma se esconde) e, provavelmente, discutida com uma certa antecedência (tanto que já havia vazado no final de semana, na Folha de São Paulo).

Na mesma declaração que mencionei acima, Lula ainda disse que "quando sai uma notícia errada na área econômica quem sofre é o povo brasileiro". Nisso ele está correto: quem vai pagar a conta das consequências da medida, como um custo de financiamento maior da dívida do tesouro e menor disponibilidade de investimentos de estrangeiros, é, de fato, o povo brasileiro. Que pode se preparar para mais trapalhadas vindas de Brasília -- este post acabou ficando grande demais, falo disso e da Vale no próximo.

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