quinta-feira, 30 de setembro de 2010

A tal da taxa de juros de equilíbrio

Taxa de juros de equilíbrio é algo assim como aura: tem gente que acredita, outros afirmam que conseguem enxergá-la e até que ela muda de cor (ou de nível). No seu relatório de inflação do terceiro trimestre, os economistas do Banco Central tentam atacar esse problema esotérico, que tem sido alvo de muitas discussões desde que o Copom parou de subir os juros básicos, no início deste mês.

O BC faz uma revisão bastante abrangente da literatura, e chega na seguinte tabela para diversos países (clique para aumentar):


Interessante ver que há estimativas de -2% para a Zona do Euro (ouch...) e que no Peru o modesto intervalo é entre 6% e 17% (como o país está sobrevivendo - ousadia! - com juros reais perto de 1% é outro mistério). Seria desnecessário dizer, mas para todos os demais emergentes listados os juros de equilíbrio são menores que os praticados no Brasil (entre 6% e 8%, dependendo da conta que se faz).

O melhor do estudo, e que deixaria o Edward Tufte se roendo caso ele ligasse pra essas coisas mundanas, é o gráfico a seguir:


Na melhor tradição Rubens Ricupero, esqueceram o eixo vertical. Ou seja: a taxa de equilíbrio no Brasil, vejam, está caindo. Mas, pra não assutar ou constranger ninguém, melhor não falar em níveis ("superiores às observadas na maioria dos países listados na Tabela 1", diz o BC). Logo mais descobrem na marra que o país não explode em uma orgia de consumo se o juro não for 5 pontos percentuais acima da média mundial, e os modelos vão atrás.

E o dia não começou muito bem para os espanhóis...

Na Bloomberg:

Spain's Credit Rating Is Downgraded by Moody's to Aa1, Outlook Is Stable

Na ESPN:

Contador Tests Positive For Banned Substance


quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Orientação vocacional

Minha escolha de profissão teria sido bem mais fácil se eu tivesse isso na época...


Recebi por e-mail. Se alguém souber quem criou, puxe a minha orelha pra eu dar o devido crédito.

Frase(s) do dia - Tony Judt

Considerem uma caneca de café norte-americano. Pode ser encontrada em qualquer lugar. Pode ser fabricada por qualquer um. É barata -- e a reposição, gratuita. Como o café não tem quase gosto, pode ser diluído à vontade. O que lhe falta em encanto é compensado pelo tamanho. Trata-se do método mais democrático jamais inventado para introduzir cafeína em seres humanos. Agora pensem numa xícara de café expresso italiano. Exige equipamento caro. O preço pelo volume obtido é chocante, sugerindo indiferença ao consumidor e ignorância do mercado. A satisfação estética que acompanha a bebida supera em muito seu impacto metabólico. Não é uma bebida, é um artefato.

Tony Judt, historiador britânico que morreu no último 6 de agosto, ilustrando as diferenças entre Estados Unidos e Europa em um dos ensaios do magistral Reflexões sobre um século esquecido.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

A última consequência econômica da paz

A Alemanha fará no próximo dia 3 o último pagamento (€ 56 milhões) das reparações pela I Guerra Mundial, 91 anos depois do Tratado de Versalhes. Seu Keynes pode descansar em paz.

Mais no Der Spiegel.

Crescimento x democracia

Bill Easterly olha para o mistério abaixo:


Gráfico do dia - ciclos





Uma nota sobre progressismo

O Mansueto Almeida soltou uma provocação muito interessante na semana passada, ao comentar sobre uma matéria que o Valor fez com Maria da Conceição Tavares. Vou estendê-la para as possíveis políticas econômicas dos três principais candidatos à presidência. Nenhum deles ousa propor qualquer mudança na santíssima trindade (o tal "tripé de estabilidade" dos últimos anos) metas de inflação, câmbio flutuante e responsabilidade fiscal. Não vejo nada errado nas ferramentas per se, mas do jeito que elas são defendidas parece que o Brasil encontrou o santo graal da estabilidade e do crescimento. O curioso é analisá-las olhando para o resto do mundo. Metas de inflação estão virando rapidamente uma curiosidade histórica: os países desenvolvidos provavelmente vão encontrar dificuldades para estabilizar os preços nominais nos próximos anos, e pelo jeito só vai haver inflação nos países onde alimentos têm um peso grande nos índices de preço -- inflação cíclica e com grande influência do acaso, pouco influenciada por política monetária. Câmbio flutuante também está ficando fora de moda, com o mundo todo aderindo à flutuação "suja" (com forte interferência dos bancos centrais) e o caso de crescimento mais festejado desta geração (China) acontecendo com uma taxa fixa (e notoriamente depreciada) de câmbio. A responsabilidade fiscal é menos "atacável", mas nem o governo brasileiro tem levado tão a sério (disfarçando parte da gastança via empréstimos do BNDES), nem o mundo anda punindo quem soltou um pouco a mão nos últimos anos.

É compreensível que, numa eleição onde o governo tem 80% de aprovação, seja difícil propor qualquer mudança ao modelo em curso. Mas chegamos no ponto em que até as aberrações devem ser mantidas, em nome de uma suposta manutenção da prosperidade: aparentemente ninguém vê problemas em seguir pagando juros de dois dígitos quando até a Turquia (inflação média de 8,7% ao ano nos últimos cinco anos) consegue se financiar em moeda local a menos de 9%. Onde está o progressismo? O Brasil alcançou um relativo sucesso com uma dose de sorte e algumas políticas acertadas; precisamos começar a pensar no próximo passo (é desnecessário listar quanta coisa ainda precisa ser arrumada por aqui), ou pelo menos no que faremos quando a tal sorte virar. Curiosamente, ao mesmo tempo em que o Brasil é um caso de sucesso, o mundo está numa fase tão maluca que pouca coisa seria vista como extravagância; não consigo pensar em momento melhor para experimentar pelo menos conviver com uma taxa de juros compatível com este planeta.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

UK Press ♥ Brazil

Dois artigos de dois grandes jornais britânicos no fim de semana:

No The Independent:


Estão falando da Dilma, claro -- dizendo que a eleição da próxima semana marcará a demolição da influência dos governos conservadores da Europa e dos EUA sobre o Brasil, que limitava a democracia e as reformas. Menos, né? Se tem algum interesse que trava as reformas por aqui é o dos empresários brasileiros, que, surpresa!, financiam a eleição dos políticos.

No The Guardian:

Lula hails Brazil's oil-fuelled '30-year boom'

Mais confete para Lula, a Petrobras, Eike Batista... O futuro chegou, e ele é cor-de-rosa, seja pela mistura de vermelho e branco do PT ou por uma nova combinação: preto (do petróleo) + verde (dos dólares que vão seguir entrando aqui, sem parar).

Bronca do dia - Folha

Mesmo reconhecendo no texto que:

Correlação, vale lembrar, é um conceito traiçoeiro. Quando duas variáveis estão correlacionadas, tanto é possível que qualquer uma delas seja a causa da outra como também que ambas sejam efeitos de outros fatores.

A Folha tascou no título da matéria que fala sobre uma pesquisa do Gallup em 114 países:

Quanto mais religioso, mais pobre tende a ser um país

Liberais ateus / agnósticos e religiosos de qualquer orientação devem reclamar da leviandade...

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Tio Sam e Keynes

Impagável. Via The Big Picture.


Capitalização da Petrobras - quem ganhou?

Considerando a euforia com o parto da maior oferta de ações da história (passamos para o "nunca antes na história da humanidade" e entramos no maior delírio de grandeza do país desde o "milagre" dos anos 1970), muita gente -- políticos, fornecedores, banqueiros de investimento, a lista segue. O mero mortal acionista, entretanto, por enquanto aguarda um desfecho favorável para uma sequência de eventos cercados por incerteza (já falei sobre isso aqui). Nessa condição, só teve chance de garantir algum ganho quem tinha os papéis e vendeu antes do mercado derrubar os preços nos meses que antecederam a operação -- entre outros possíveis, surge, inevitavelmente, o nome de George Soros.

O Soros Fund havia comprado US$ 811 milhões em ações da Petrobras negociadas em Nova York (ADRs) durante o segundo trimestre de 2008. Reduziu a posição um ano depois e saiu completamente do investimento entre abril e junho deste ano. Passou longe de ser uma aposta brilhante (o preço médio no período em que ele comprou foi de US$ 107,5, e, durante as vendas US$ 79,4 e US$ 69,9, respectivamente), mas poderia ser ainda pior caso tivesse insistido no erro -- hoje os papéis operam a US$ 35,5. Claro que a história poderia ser outra, mas vai ser mais uma para alimentar a aura do maior especulador dos nossos tempos.

Este blog aplaude...

... a iniciativa do diretor de política monetária do Banco Central Aldo Mendes, que, com a circular 3506, vai acabar com (ou pelo menos reduzir drasticamente) a possibilidade de manipulação da PTAX (taxa média de câmbio apurada pelo BC). Parece apenas um rodapé da legislação, mas fez a fortuna de muito operador de banco às custas dos outros participantes do mercado. Bravo, sr Aldo.

Som da Sexta - Alexi Murdoch

Da trilha do último (e ótimo) filme de Sam Mendes (Away We Go) que, sabe-se lá porque, nem passou pelo cinema aqui no Brasil.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

BBC Hardtalk entrevista Hugh Hendry

É sempre bom ouvir um dos mais interessantes gestores de hedge fund do mundo -- aqui numa longa entrevista para o programa Hardtalk, da BBC (felizmente alguém colocou no YouTube, a BBC não deixa computadores de fora do Reino Unido acessarem seus arquivos de vídeos -- esnobes). Esta é a primeira de três partes, os links para as seguintes estão abaixo:


Parte 2

Destruição criativa

O velho Schumpeter estaria orgulhoso: enquanto a Blockbuster vai à falência, as ações da Netflix estão na máxima histórica.


Dois sinais contrários ao real

Bob Farrell rule # 5:
The public buys the most at the top and the least at the bottom

A valorização do real por conta da entrada dos dólares da capitalização da Petrobras está chegando no extremo. Não bastasse um amigo me contar que ouviu do roupeiro do clube onde nada que "o Fluminense é que nem o dólar, só cai", esta semana a Isto É Dinheiro apareceu com uma capa falando das maravilhas de viver com um câmbio valorizado (a imagem aí do lado ilustra a matéria). E o Estadão do domingo passado chama a atenção para a euforia dos investidores individuais asiáticos (sobretudo no Japão) com suas aplicações em real.

Se isso faz alguma diferença para suas decisões, parece que estamos em uma boa hora para comprar os dólares que você pretende gastar nos próximos meses; creio que dificilmente veremos o câmbio por muito tempo perto dos R$ 1,70 / US$.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Dose de ignorância do dia - adivinhe quem?

"É uma compra de real por dólar, não há gasto".

Vossa Eminência Guido Mantega, falando das compras de dólares a serem feitas pelo Fundo Soberano Brasil.

Memo:

Juros para aplicação overnight em dólares (Fed Funds): 0,21% ao ano
Juros para aplicação overnight em reais (Selic): 10,66% ao ano

Juros de 10 anos em dólares (taxa de retorno do T-Note): 2,53% ao ano
Juros de 10 anos em reais (taxa de retorno da NTN-F 2021): 11,82% ao ano

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Comunicado do Fed, versão direto ao ponto

A economia está uma merda, ainda pior do que imaginávamos. Mas o dinheiro vai continuar barato de graça para que os preços dos ativos continuem subindo e possamos continuar com a sensação de que alguma coisa está melhorando. In bubbles we trust. Aproveitem a festa.

A versão oficial está aqui.

Como a crise mudou o ensino de economia?

É o debate que está rolando no site da The Economist. Vai lá, tem muita gente boa palpitando (Michael Pettis, Michael Bordo, Guillermo Calvo, Stephen King, Tyler Cowen, Hal Varian...).

Um bom seminário na FEA-USP

Para quem estiver em São Paulo no dia 7 de outubro (não vai ser meu caso, infelizmente), fica a dica. Uma boa oportunidade de comparar o que o BNDES está fazendo com um caso reconhecido de sucesso (clique para aumentar o convite).


Econometria aplicada ao esporte

E viva a extrapolação.



Dica do Balu. As outras versões da propaganda (Chile e Argentina) também são fantásticas.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Frase(s) do dia - Robert Shiller

Numa entrevista para a Folha de ontem:

A Petrobras está fazendo a maior oferta de ações do mundo para financiar a exploração de petróleo. Há risco de uma bolha do pré-sal?
É interessante trazer essa discussão para o petróleo, que tem história de avaliações equivocadas. O México fez descobertas incríveis nos anos 80 e 90. Isso levou a uma euforia. As empresas e os mexicanos emprestaram muito dinheiro. Eles se achavam ricos. Depois, veio a crise de 1994. Definitivamente, há esse risco no Brasil.

Número do dia: 155%

A energia elétrica no Brasil, diz a Folha, é 155% mais cara que nos EUA (R$ 0,35 por KWh contra R$ 0,137). O empreendedor brasileiro é, antes de tudo, um forte.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Gráfico do dia - commodities agrícolas

As commodities agrícolas têm se recuperado de um início de ano não muito auspicioso. Preparem-se para alguma alta da inflação e os terroristas de plantão dizendo que o Banco Central errou ao parar de subir os juros.


Som da Sexta - Arthur Blythe

Modo saudosismo ligado: bons tempos em que companhias de bebidas alcoólicas e cigarro podiam patrocinar festivais de jazz de primeira no Brasil.

No Chivas Jazz de 2003, Arthur Blythe comanda um trio pouco usual: bateria, sax alto e tuba. Sonzaço.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Se eu morasse em...

Amartya Sen deve adorar: IfItWereMyHome.com, um site que compara como seria sua vida se você vivesse em outro país. Impossível não perder um tempo clicando.

Gráfico do dia - Que deflação?

Munique se prepara para a 177ª edição (em 200 anos) da sua Oktoberfest, e Alexander Koch, do banco italiano UniCredit, escreveu um dos relatórios econômicos mais úteis dos últimos tempos. Ele conclui que os pobres visitantes da festa têm sofrido com uma alta nos seus custos (representados pelo Weisn Visitor Price Index, composto de transporte para o pavilhão, dois litros de cerveja e meio frango grelhado) muito acima da inflação:


O principal culpado é o preço da cerveja, que tem subido mais de 4% ao ano desde 1985 (passou de EUR 3,10 para EUR 8,65 no período).

Como não podia deixar de ser, o relatório termina com 10 dicas para evitar a ressaca. Wunderbar!

Mais no Alphaville.


quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Fear the Boom and Bust - Hayek vs Keynes

Eu geralmente tenho vergonha dessas piadas multimídia de economistas, mas esta é MUITO boa.



We’ve been going back and forth for a century
[Keynes] I want to steer markets,
[Hayek] I want them set free
There’s a boom and bust cycle and good reason to fear it
[Hayek] Blame low interest rates.
[Keynes] No… it’s the animal spirits

Dez mil

Este humilde blog atingiu há pouco a marca de dez mil acessos. Agradeço a todos que tem passado por aqui. Sem vocês, escrever tem tanto valor quanto a nota aí do lado.

Frase do dia - Stephen King

"The sad truth is that, having lived beyond its means, the Western world will now have to put up with many years of austerity."

Stephen King, economista-chefe do HSBC, em um interessante relatório sobre política econômica publicado esta semana (a íntegra está aqui). Talvez o escritor de terror esteja mais otimista.

Vale a pena entrar na oferta da Petrobras?

Alguns amigos, talvez não sabendo da minha ignorância sobre o assunto (eu trabalho numa mesa de operações, mas não diretamente com ações), têm me perguntado se vale a pena entrar na nova oferta de ações da Petrobras. Para quem quiser a minha opinião, aí vai (e para o próximo que me perguntar, eu só mando o link):

Partindo do básico: a Petrobras está indo a mercado levantar dinheiro para investir na exploração do pré-sal. Vai ser, provavelmente, a maior oferta de ações da história (nunca antes na história da humanidade...), podendo chegar a R$ 150 bilhões (mais ou menos o PIB da Bulgária). Só pelo tamanho a operação não seria trivial; para complicar, uma parte grande desse dinheiro virá do Tesouro Nacional, envolvendo uma troca de ações por barris de petróleo no futuro. Para encurtar uma longa história, nada melhor do que olhar para o mercado, que reflete tudo o que já foi digerido sobre o assunto e mais algumas especulações sobre o futuro: as ações da Petrobras caíram 17% desde o início do ano (com o Ibovespa caindo apenas 1,3%, menos ainda se desconsiderarmos o impacto da Petrobras).

Essa queda de 17% pode ser lida de diversas maneiras. Na minha opinião, reflete, sobretudo, o aumento de participação do governo no capital da empresa e o risco de que a Petrobras tenha que aceitar vender as ações a um preço mais baixo por conta de uma demanda mais fraca do que esperada inicialmente. De qualquer maneira, a situação é a seguinte: está todo o mercado esperando o resultado da capitalização (dããã). Há uma certa convicção de que a Petrobras vai fazer a operação mesmo a um preço mais baixo do que o de mercado, e a probabilidade disso acontecer oscila junto com o apetite do mercado por ações mundo afora. No curto prazo, portanto, o investimento na Petrobras parece ser uma aposta mais alavancada no humor do mundo: se tudo estiver bem perto da precificação, as ações devem subir; se não, devem continuar caindo até um nível que atraia os compradores para a oferta (ou que obrigue o governo a aumentar ainda mais sua fatia, o que é igualmente ruim para os preços). Assim, para os próximos meses, acho que o componente especulativo do investimento é muito grande, e não vejo nenhuma assimetria óbvia. Se o mercado estiver bem, pode subir muito; se estiver mal, pode machucar o comprador. Quem quiser arriscar, que faça sabendo desses riscos.

Mais para a frente, o sucesso da Petrobras depende de (pelo menos) dois fatores: o preço do petróleo no mercado internacional e o sucesso na operação do pré-sal. O preço médio do barril de petróleo nos últimos dez anos, é bom lembrar, foi de US$ 54,6, oscilando entre US$ 18 e US$ 145. Todo mundo sabe que as fontes de petróleo no mundo estão se esgotando, que a demanda da China cresce todo ano, etc, etc; ainda assim, há tempos o preço do óleo não sobe de forma sustentada (meu palpite leviano é que o máximo histórico do preço do petróleo ajustado pela inflação já ficou para trás, mas não colocaria um centavo nele). Ninguém sabe a quanto a Petrobras conseguirá vender o óleo quando os poços do pré-sal começarem a produzir, e isso fará toda a diferença para a empresa. A outra questão é SE a Petrobras vai ter sucesso em uma operação inédita, complexa e de alto risco, mas essa deixo para os especialistas.

Um grande amigo que trabalha na Petrobras parafraseou, esses dias, a famosa frase do John Rockefeller: "O melhor negócio do mundo é uma empresa de petróleo bem administrada. O segundo melhor negócio é uma empresa de petróleo mal administrada. A Petrobras é o terceiro melhor negócio do mundo". Rockefeller morreu em 1937; o sucesso da Petrobras nos próximos anos depende de que o mundo não tenha mudado muito desde então.

Desarbitragens

Eis um mercado que ainda oferece oportunidades para arbitradores arrojados:

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Cartoon do dia - queimando livros

Enquanto o Fed debate se deve ou não voltar a ligar a impressora de dinheiro...


Via Slate.

Frase do dia - progresso

"All progress is based on a universal innate desire on the part of every organism to live beyond its income."

Samuel Butler, citado por William Bonner (é, o marido da Fátima Bernardes tem um homônimo que escreve sobre mercados) e Lila Rajiva no Mobs, Messiahs and Markets, que estou lendo. As coisas estão no mundo, só que eu preciso aprender.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Michael Lewis sobre a Grécia

Michael Lewis foi à Grécia tentar descobrir como anda o país que tem sido o assunto favorito no mercado financeiro quando tenta-se ver o copo meio vazio. Além das anedotas sobre corrupção e impostos e de uma história surreal sobre monges ortodoxos que viraram megaespeculadores imobiliários, a matéria da Vanity Fair traz um insight muito interessante, no último parágrafo:

"It [Greece] behaves as a collection of atomized particles, each of which has grown accustomed to pursuing its own interest at the expense of the common good."

Parece ser um exemplo extremo do que acontece quando os princípios de mercado, sem considerações éticas e morais, passam a ser aplicados para toda a sociedade -- como George Soros tinha mencionado nas suas aulas, que comentei aqui. Observar o que vai acontecer com a Grécia e sua luta para manter a prosperidade alcançada nos últimos anos vai ser muito interessante, e talvez forneça um mapa do que vai acontecer no resto de um mundo extremamente endividado, desesperado para gastar hoje o que conseguir de uma riqueza que ainda não foi gerada.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Peso-real, a panacéia

Desde que parei de ler o Stephen Kanitz (me perdoem... eu era jovem e inconsequente) eu não via uma solução tão mágica e simples para nossas mazelas. Doutor Paulo Guedes, na Época desta semana, defende fervorosamente a implementação de uma moeda única para a América Latina, o peso-real. Nas palavras dele:

"Para tornar possível a realização de nossa riqueza potencial, a classe política brasileira precisa também ser salva de si mesma. A chave para as reformas é a moeda continental, com horizonte de oito a dez anos para sua implantação. As reformas tributária, trabalhista e previdenciária, gradualmente implantadas em direção às melhores práticas, permitiriam extraordinário desempenho da economia brasileira pelo aumento de sua eficiência interna e da sua competitividade externa. Uma poderosa alavanca de nossa importância geopolítica."

É mesmo? Doutor Paulo (PhD pela Universidade de Chicago, diga-se de passagem) consegue, ao mesmo tempo, violentar a teoria e a prática: na teoria, moedas únicas podem ser implementadas em regiões que se aproximam de uma zona monetária ótima, com as seguintes características (definidas pelo Nobel de economia em 1999 Robert Mundell): mobilidade de mão-de-obra, mobilidade de capital, flexibilidade de preços e salários, alguma unidade fiscal e economias com ciclos parecidos. Difícil acreditar que nosso continente cumpre qualquer um desses requisitos -- imaginemos a Argentina aceitando o fluxo de imigrantes bolivianos, o Indec afinando os métodos de medir a inflação com o IBGE, um banco central tentando chegar em juros aplicáveis ao Brasil e ao Chile, e por aí vai. Na prática, olhando para o que tem acontecido com a zona do euro (que também está longe de ser uma zona monetária ótima), implantar uma moeda única está longe de se provar um benefício inequívoco para as economias envolvidas: deixou alguns países aparentemente mais ricos (ao custo de um câmbio ultravalorizado, endividamento e baixa competitividade) e os que já eram ricos tendo que sustentar um setor bancário que está abraçado a essas dívidas. Incentivo às reformas citadas, creio, houve pouco, os países seguem cada um com seus problemas estruturais.

Felizmente parece ser difícil enxergar um meio dessa ideia se concretizar por aqui, já que em todo o tempo de Mercosul sequer um mercado comum funcional conseguiu ser estabelecido. Pior para o doutor Guedes, que vai ter que se esforçar para encontrar soluções mágicas para suas próximas colunas (poderia pedir umas dicas para o Kanitz).

P.S. A América Latina está mesmo na moda -- vide a capa da última The Economist, aí do lado.

Som da Sexta - Melody Gardot

Seria um desperdício se uma pessoa nascida com o nome Melody não tivesse se tornado uma cantora talentosa e deliciosa de se ouvir...

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Essa tal taxa de câmbio...

"A inflação aleija, mas o câmbio mata", é a famosa frase do Mario Henrique Simonsen que sempre vem à cabeça quando começam a aparecer evidências de que a taxa de câmbio está fugindo do seu controverso equilíbrio. Recomendo dois bons textos sobre o tema: uma análise do Dani Rodrik sobre como a política mercantilista da China tem afetado os exportadores de commodities (segundo ele, isso cria uma dependência no setor externo do preço das commodities e não estimula uma diversificação da economia que poderia promover aumentos de produtividade). E no beyondbrics do Financial Times, Jonathan Wheatley fala sobre a nova pernada de valorização do real na expectativa da entrada dos dólares para a capitalização da Petrobras.

Frase do dia - antes tarde do que nunca?

Jeffrey Goldberg, correspondente da revista americana The Atlantic, esteve em Cuba e alega ter ouvido da boca do Comandante en Jefe Fidel Castro, quando perguntou se ele acreditava que o modelo cubano valia a pena ser exportado:

"The Cuban model doesn't even work for us anymore."

A matéria completa está aqui, e narra também uma bizarra visita do repórter a um show de golfinhos, na companhia de Fidel e da filha de Che Guevara.

Gráfico do dia - o inferno da comutação

Andei procurando dados a respeito disso há um tempo, e achei uma fonte por acaso, folheando a SuperInteressante. A IBM realizou uma Commuter Pain Survey, entrevistando 8,192 motoristas em 20 cidades espalhadas pelo mundo, e criou um Commuter Pain Index, composto por 10 critérios (mais no site da IBM). O resultado foi o seguinte:


Na SuperInteressante há algumas aberturas desse índice: os paulistanos levam, em média, 33 minutos para chegar ao trabalho (o sexto maior tempo, atrás de Moscou, Nova Delhi, Pequim, Cidade do Mèxico e Joanesburgo). Estão, porém, entre os que saem mais cedo de casa (junto com os motoristas de Joanesburgo), entre 6 e 7 da manhã, talvez para que os 33 minutos não se transformem em horas.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Trend is (indeed) your friend

Gavyn Davies (do Financial Times) olha para um experimento feito por um economista do Banco da Inglaterra que consiste simplesmente em seguir o último movimento do mercado em um determinado período de tempo (comprando quando o mercado sobe e vendendo quando cai). Os resultados são intrigantes, sobretudo para quem acredita na hipótese dos mercados eficientes.

O gráfico ao lado é do preço do ouro nos últimos trinta anos, que fechou hoje em uma nova máxima histórica. Os bárbaros seguem com força.

Frase do dia - estourando bolhas

"No dia em que achar que as minhas companhias estão [super] avaliadas, com preços inflados na bolsa, eu mesmo enfio o dedo nessa bolha."
Eike Batista, em entrevista para a ValorInveste deste mês. Esperamos sentados, então.

75 anos do Monopoly

Este ano o Monopoly, que deu origem ao nosso Banco Imobiliário, completa 75 anos de seu lançamento pela Parker Brothers. No livro The Ascent of Money (lançado aqui como A Ascensão do Dinheiro), o historiador britânico Niall Ferguson usa a história do jogo para ilustrar como os anglo-saxões desenvolveram o culto de adquirir imóveis. Segundo Ferguson, a primeira versão do jogo foi criada em 1903 por Lizzie Phillips, e tinha a intenção de "mostrar a desigualdade de um sistema social no qual uma pequena minoria de donos de terra lucravam com os aluguéis recolhidos de seus inquilinos". Essa versão mostrou-se complexa demais para o gosto do público, mas foi simplificada por dois professores (um de Wharton, outro de Columbia) e transformada de vez em um produto comercial por um engenheiro chamado Charles Darrow, que vendeu o jogo para a Parker Brothers. Ao contrário do que imaginava Lizzie Philips, a moral do jogo transformou-se em "quanto mais você tem [propriedades], mas dinheiro você ganha", e isso ajudou a formar a noção na sociedade (fortemente abalada nos últimos anos) de que não há melhor investimento que imóveis.

No Brasil, a Estrela deteve por muitos anos o licenciamento do jogo em Português (com os clássicos endereços do Rio e São Paulo -- naquele tempo, a avenida Faria Lima valia muito menos que Morumbi). Em 2008, a Hasbro (da qual a Parker Brothers é subsidiária) decidiu se instalar no Brasil e lançar o jogo com seu nome original, enquanto a Estrela seguiu produzindo o Banco Imobiliário em diferentes versões (com cartão de crédito, versão "sustentável", etc), não sei se ainda pagando royalties para a Hasbro.

O tabuleiro aí do lado está numa galeria de 50 versões do jogo que o Damn Cool Pics fez.

P.S. O Banco Imobiliário é o tema de uma crônica genial do Pedro Ivo Resende (O Amigo Socialista), que escrevia, pelos idos de 2000, o Loser, primeiro blog que me lembro de acompanhar.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Enquanto isso, no iPhone do Obama...




FUBAR = fucked up beyond all/any repair/recognition. Aprendi mais um tesouro da língua de Shakespeare.

Som da Sexta Especial - as 5 melhores sequências de álbuns da história do pop / rock

(em ordem alfabética, claro)

1. The Beatles

Help (1965), Rubber Soul (1965), Revolver (1966), Sgt. Pepper's (1967), Magical Mystery Tour (1967), White Album (1968). Daria para estender até Abbey Road (1969) e Let It Be (1970) se ignorarmos a trilha do Yellow Submarine, que não foi exatamente pensada como um álbum.



2. David Bowie

Space Oddity (1969), The Man Who Sold the World (1970), Hunky Dory (1971), The Rise and Fall of Ziggy Stardust and the Spiders from Mars (1971), Aladdin Sane (1973). Demorei pra aprender a gostar de David Bowie, que perda de tempo...



3. Led Zeppelin

Led Zeppelin (1969), Led Zeppelin II (1969), Led Zeppelin III (1970), Led Zeppelin IV (1971), Houses of the Holy (1973), Physical Graffiti (1975). A qualidade da música é inversamente proporcional à criatividade no nome dos quatro primeiros discos.



4. The Rolling Stones

Beggars Banquet (1968), Let it Bleed (1969), Get Yer Ya-Ya's Out! (1970), Sticky Fingers (1971), Exile on Main St. (1972). Não dava mesmo para competir com os Beatles, o auge dos Stones foi alguns anos depois do sonho ter acabado.




5. Stevie Wonder

Where I'm Coming From (1971), Music of My Mind (1972), Talking Book (1972), Innvervisions (1973), Fulfillingness' First Finale (1974), Songs in the Key of Life (1976). Depois de tudo isso, ele tinha só 26 anos. Vai ter talento assim...



Etiópia desvaloriza

A Etiópia vai começar o ano novo (no calendário etíope, 2003 começa no próximo dia 11) com sua moeda, o birr, 20% desvalorizada (soube pelo Chris Blattman). A medida seria uma tentativa de copiar o "modelo chinês", mantendo uma moeda muito desvalorizada para estimular exportações e substituição de importações.

As principais exportações da Etiópia são o café (é o quinto maior produtor mundial) e o qat, uma planta que é usada como narcótico e é onipresente na parte muçulmana do chife da África e no Iêmen. Seus produtores devem estar muito satisfeitos com a nova medida; o outro lado é que as importações vão ficar mais caras, e desconfio que para muitos produtos não há substitutos produzidos localmente -- a indústria da Etiópia é praticamente inexistente, resultado de séculos de isolamento, seguidos de um regime comunista e uma pseudo-democracia também voltada para o controle estatal da economia. Eu estive na Etiópia em fevereiro (sim, há quem passe férias na Etiópia - recomendo), e um dos meus muitos choques foi passear nos supermercados de Addis Abeba e constatar que quase todos os produtos industrializados eram importados: havia biscoitos da Bauducco (!!!), farinha de trigo da Arábia Saudita, café solúvel egípcio, e por aí vai. Evidentemente a maior parte da população nem sonha em ter acesso a esse tipo de bem, mas o que vale para os supérfluos deve valer também para insumos agrícolas e medicamentos, por exemplo.

O câmbio desvalorizado pode aumentar a atração de capital chinês, que tem sido responsável por boa parte das obras de infraestrutura nos últimos anos, e acelerar o desenvolvimento do país. Pode também ter sido apenas um arranjo em favor de alguns produtores agrícolas, em detrimento do resto da população. Espero que o futuro confirme a primeira opção.

P.S. As notas de birr são das mais bonitas que já vi.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Piada de português

Portugal emite dívida a mais para impressionar investidores

Eu achava que PAGAR dívida impressionasse investidores... Brave new world!

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

As novidades da Apple

Ainda não foi dessa vez que as ações da Apple falharam em subir depois de um anúncio de novos produtos (sobem 2,5%, ajuda os índices subirem mais ou menos isso, também). Desta leva estão saindo: um novo sistema operacional para o iPad e o iPhone, uma nova linha de iPods (sem o iPod Classic, preferido dos dementes como eu e o Ed Motta, que gostam de carregar no bolso uma audioteca gigante -- acho que vou comprar alguns para quando o meu quebrar), um novo iTunes (que inclui uma rede social de música parecida com o last.fm) e, ufa, uma nova Apple TV. Mais no Gizmodo.

Krugman está errado?

O Na Prática a Teoria é Outra lançou a discussão, e eu respondi o seguinte lá (vale conferir os outros comentários, estão muito bons):

Vai ter quem diga que ele [Krugman] está errado por definição, só pela Newsweek ter feito uma capa com ele. Mas vamos partir do princípio que o Krugman não é nem lunático, nem burro. O argumento central dele é que os EUA precisam continuar com os estímulos fiscais e monetários para que a economia não arrisque entrar numa depressão brava. Os gastos do governo substituiriam o crescimento "perdido" com a retração no consumo e a desalavancagem, e funcionariam como uma muleta até que a economia consiga andar com as próprias pernas.

Acho que não tem como colocar essa questão em termos de "certo" ou "errado", cada vez mais eu acho que política econômica é um negócio de tentativa e erro, e o que funcionou para um país pode não funcionar para outro (e vice-versa). Eu vejo as seguintes possíveis falhas na visão dele:

- A primeira, e mais óbvia, é o custo dos estímulos, que é convertido em dívida pública que um dia tem que ser paga (ou rolada). Como os EUA emitem dívida em moeda local, é muito baixa a probabilidade de um dia eles repudiarem essa dívida, mas pode ocorrer do custo dela ficar muito alto (o mercado subir os juros por achar que seu volume é exagerado), o esforço fiscal para pagar não ser suficiente e ela ter que ser monetizada. Na cabeça dos monetaristas, isso gera inflação instantaneamente, mas não é o que a evidência histórica (Japão) mostrou, por enquanto.

- Um segundo risco é os EUA repetirem o script do Japão nos últimos 20 anos - não faltou dinheiro na economia, isso não se traduziu em inflação, mas a economia perdeu totalmente o dinamismo e o governo tem que sustentar ad eternum montes de companhias "zumbis". Não vejo esse cenário como horroroso, uma vez que os japoneses têm passado longe de empobrecer ou de piorar radicalmente a qualidade de vida, mas para chegar nele os mercados ainda teriam que passar por uma fase de reconhecimento que pode ser bastante turbulenta.

- Outro problema é a questão dos incentivos: deixar todo o crescimento por conta do Estado vai gerar corrupção, um "agent problem" gigantesco, desincentivo à inovação...

Dito isso tudo, eu acho que, a essa altura (o sistema financeiro já não implodiu, os mesmos erros de 1929 não foram cometidos), o suporte do governo é uma tentativa desesperada de comprar tempo e uma sacanagem imensa com as próximas gerações. A questão fundamental é que, nos últimos anos, boa parte do crescimento, da valorização dos ativos, do lucro das empresas, do aumento de prosperidade de parte da população, etc, foram ilusórios, baseados, grosso modo, em tomadas de crédito que nunca serão pagas. Creio que enquanto isso não for reconhecido e os devidos ajustes forem feitos, a economia não volta a funcionar nos moldes capitalistas que conhecemos. O problema é que isso parece não ser de interesse da geração que tem poder (político e econômico), que está envelhecendo e quer saber de garantir um futuro razoavelmente tranquilo; enquanto a próxima geração não tiver "constituency" para mudar as coisas ou o sistema não travar de vez, a solução para qualquer problema vai ser imprimir dinheiro.

Sport Club Corinthians Paulista, 100

Embora cada vez eu tenha mais vergonha de acompanhar futebol, isso AINDA não consegue apagar 100 anos de história. Parabéns a todos os sofredores mundo afora.