 Se me pedissem para destacar duas características (que não necessariamente são qualidades) do presidente Lula, eu diria: oportunismo e sorte. Outras podem ser mais marcantes e até definí-lo melhor, mas sem essas provavelmente ele estaria numa situação bastante diferente da que vive agora.
Se me pedissem para destacar duas características (que não necessariamente são qualidades) do presidente Lula, eu diria: oportunismo e sorte. Outras podem ser mais marcantes e até definí-lo melhor, mas sem essas provavelmente ele estaria numa situação bastante diferente da que vive agora.A sorte, como já falei aqui em outras oportunidades, foi a de ter governado o Brasil em uma conjuntura absolutamente favorável. Primeiro, foi eleito com o mercado financeiro no fundo do poço, com juros muito altos e preços de ativos bastante depreciados -- uma melhora desse ponto é mais provável e mais acentuada do que se tudo estivesse na calmaria. Depois, desfrutou de anos de alta em preços de commodities, e consequentes apreciação do câmbio, queda nos juros, aumento das reservas internacionais, inflação relativamente controlada, investment grade... Com o petróleo perto da máxima histórica, a Petrobras descobriu uma das maiores reservas do mundo. Quando veio a crise, esta atingiu primeiro e mais fortemente os países e empresas muito alavancados -- sendo que o Brasil, por razões históricas (e não por mérito) é, provavelmente, a economia grande menos alavancada do mundo. Para completar, a recuperação da crise tem sido marcada por uma alta generalizada em preços de ativos, e a ciranda favorável para o Brasil segue rodando. Com toda essa combinação, é preciso ser muito cético para não achar que Lula tem algum mérito. Certamente ele tem, mas ele é muitas vezes menor que a simples e pura sorte do presidente (sim, sou um cético).
O oportunismo foi, até há pouco, político. Lula tem a incrível capacidade de estar ao lado de todos e contra ninguém. Seus aliados podem ser derrubados, mas Lula nunca tem nada a ver com isso, nem sequer sabia do que acontecia. O investidor Jeremy Grantham já chamou os apadrinhados de Robert Rubin de "teflon men". Se ele acompanhasse a história de Lula, provavelmente teria que redefinir o termo.
Tudo isso para falar que, aparentemente, estamos entrando numa nova era de oportunismo, desta vez no campo econômico. Pois a crise danificou muito a idéia de livre mercado, e agora dá vez novamente aos partidários do "estado grande". E é muito fácil (e conveniente) encaixar o Brasil nesse contexto: saímos rápido da crise porque o governo foi prudente na euforia e investiu e aumentou os gastos quando todos estavam apavorados. Portanto, quem sabe quando, quanto e onde investir é o sábio Estado. Fora com os especuladores gananciosos e empresários covardes.
A interpretação pode parecer exagerada, mas veja esses trechos da entrevista de dona Dilma na Folha de ontem (se achar que estou sendo viesado na escolha das frases, vejam a entrevista completa aqui):
O que se viu no mundo nos últimos tempos é que a tese do Estado mínimo é uma tese falida.
FOLHA - Nacionalista vocês aceitam. E estatizante? 
DILMA - Se é o aumento da capacidade de planejar o país, de ter parcerias com o setor privado, de o Estado ter se tornado o indutor do desenvolvimento, concordo.
O presidente ficou chocado com empresas que demitiram bastante na crise sem ter consideração pelos empregos do país.
Não se trata de prejuízo, se trata do tamanho do lucro, a mesma coisa da Petrobras. O que vale para a Petrobras vale para a Vale.
(A Vale, como sabemos, é uma empresa privada.)
O que Lula disse na última reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social também é emblemático:
Agora é hora de fazer investimento. Quem tem investimento e parou por conta da crise deve retomar. Investimentos agora vão durar três ou quatro anos e esse é o tempo que eu trabalho para que a União Européia comece a sair da crise.
Hoje poderia ser afirmada aqui que acabou definitivamente a empáfia nesse país. Aquela empáfia que tinha o governante, que achava que sabia tudo, do ministro da Fazenda que fazia um pacote atrás do outro, acabou a empáfia dos empresários que achavam que o Estado não valia mais nada, e eu penso que acabou a empáfia de uma parte da imprensa que achava que achava que com suas manchetes podia criar o clima que quisesse na sociedade.
Para quem acompanha o que escrevo, é quase desnecessário dizer o quanto acho perigosa essa idéia de "Estado grande" ganhando força. Lula está errado. Pode ter acabado a empáfia de alguns empresários, mas a empáfia do governo só aumenta. Lula e o PT estão aproveitando o momento da economia para enfiar goela abaixo do país a noção de que é necessário aumentar a influência econômica do Estado, que concentrar as decisões de investimento é bom e que um time de burocratas pouco preparados pode substituir o mercado. Há, novamente, a chance de que a sorte de Lula se estenda pelos próximos anos e que o Brasil entre num ciclo de prosperidade forte a ponto de diluir as barbaridades e ineficiências de uma economia dominada por políticos. Mas há, também, uma concentração de poder, que é exatamente o que a democracia tenta evitar. E há o risco de desastre, como a história já mostrou em tantos outros casos de economias controladas por planilhas manipuladas com arrogância, pretensão e pouco respeito a opiniões divergentes. Me abstenho de fazer previsões, mas fica aqui a justificativa da minha preocupação.
A ilustração foi roubada do cartaz do ótimo documentário brasileiro "Soy Cuba - O Mamute Siberiano", de Vicente Ferraz.
 
 











 
 
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