quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Brasil, pioneiro em metas para o PIB nominal?

Que Santos Dumont inventou o avião é
discutível, mas o escorredor de arroz
é coisa nossa.
O título, claro, é uma provocação - a adoção de metas para o PIB nominal é discutida para países em situação quase oposta a nossa, crescimento pífio e risco de deflação. Ainda assim, pensemos um pouco:

a) O Banco Central do Brasil tem uma meta oficial de inflação, e, até que se prove o contrário, trabalha para respeitá-la (com todo o benefício da generosa banda de dois pontos percentuais: a inflação anual pode ser entre 2,5% e 6,5% e está "na meta").

b) A equipe econômica do governo adora falar em objetivos para crescimento. Começou com quase 6% ao ano (ver aqui). Ultimamente, tem se ouvido que 4% é "piso" para crescimento em 2012, e Fazenda e BC dia sim, dia também, dizem que têm cartas na manga na forma de novas medidas (ou na reversão de medidas contracionistas) para estimular a economia.

Juntando a + b... Não espero que ninguém de Brasília vá a público dizer que, sim, o Brasil tem uma meta implícita de crescimento de PIB nominal, e nem sei se alguém da Fazenda ou do BC está tão comprado com o que está sendo discutido na fronteira do mundo desenvolvido. Porém, oficializadas ou não, o efeito prático dessas posturas é importante:

- PIB nominal crescendo a 10% ao ano é espetacular para o perfil da dívida. A arrecadação sobe, os quocientes do tipo dívida / PIB derretem. Soma-se a isso um cenário de queda secular dos juros e alguma disciplina fiscal, e teremos, em não muito tempo, alguns dos melhores indicadores de sustentabilidade de dívida do mundo (OK, o mundo não anda exatamente bem nesse quesito, mas mesmo em absoluto o feito do Brasil terá sido bastante impresionante);

- Na linha de que é possível ser malabarista chinês e equilibrar todos os pratinhos ao mesmo tempo, acho crescente o risco do Brasil criar um ambiente propício para bolhas, com juros mais baixos e estímulos para vários setores da economia. Ainda estamos longe disso, mas é algo para se observar ao longo dos próximos meses / anos.

- Para quem acha que juros são fator de grande influência na inflação, num mundo onde o crescimento é mais difícil e o governo vai fazer de tudo para compensar com estímulo monetário / fiscal, aumenta o risco dos preços saírem do controle - mais ainda considerando o ponto de partida de hoje, com o mercado de trabalho apertado e câmbio valorizado.

- Partindo para o lado mais iconoclasta e abstrato: o nível de ilusão de controle no comando da economia brasileira, depois de anos de relativo sucesso, é enorme. Estamos na fase de achar que só o Brasil pode segurar o Brasil, e isso é parte da receita para grandes burradas de política econômica, na eventualidade das coisas não saírem muito exatamente como se previa e alguém resolver dobrar a aposta porque "a gente é bom pra caralho".

12 comentários:

Fernando A. disse...

Boa síntese. As velhinhas corolas ficam gritando que vai dar errado mas estão percebendo que no meio da tempestade um traque nem é percebido. Demorei também. O BC bradou: vem comigo! Só não ouviu quem voltou para as séries históricas e ficou berrando aos pares: Aqui é Brasil! Com juros ninguém brinca! Papel de boboca.
Tá todo mundo, pelo menos o que faz conta, fazendo os ajustes nas previsões da selic, moderação pode significar agora cortes de 100bps.
Estimar o 2013 pra que? Tá tão fácil quanto saber o final da saga dos desenvolvidos. Ficar longo feito um louco no preto-17 ou tomar tudo que o Brasil é feito por nós? Eu que nem sou economista fico com as Bs. E cada vez menor e mais curto. O Bc poderia fazer diferente: quando inflação acumulada em 12 meses estiver na meta os juros irão em 2 reuniões para 7,5%. Mas isso poderia ser só em 2014. Estilo Dunga, e ainda convoca o Kleberson...
Abraço

Drunkeynesian disse...

" Estilo Dunga, e ainda convoca o Kleberson..."

Hahahahaha... brilhante.

Drunkeynesian disse...

Lembrando que o Tombini também é gaúcho.

Jorge Browne disse...

Gaúcho de Porto Alegre, o que só aumenta a credibilidade do vivente tchê!

Jorge Browne disse...

Para mim é o óbvio berrante que existe uma meta de crescimento. Afinal, não é mais 94, combate a inflação, austeridade e comedimento não elegem ninguém. "It´s democracy!".

DK, acho que ainda estamos muito longe dessa exuberância irracional toda que parece, corretamente, te preocupar.

De qualquer forma parece que o crédito aos mortais está apertando por conta de expectativas. Nesse sentido, e com as quedas constantes da Selic acho que está mais do que na hora de se discutir o tamanho dos spreads por aqui. Os maiores do mundo civilizado? Segundo o BC 2/3 são inadimplência e margem líquida (28,74% e 32,73% respectivamente).

Drunkeynesian disse...

Sim, também acho que ainda está distante. Nem a luz amarela acendeu ainda.

Tenho a impressão que os spreads daqui são os maiores do mundo civilizado, sim. Mas nunca parei pra estudar direito a composição, qualquer coisa que eu falar seria chute.

"O" Anonimo disse...

“Para mim é o óbvio berrante que existe uma meta de crescimento. Afinal, não é mais 94, combate a inflação, austeridade e comedimento não elegem ninguém. "It´s democracy!".”

E se você acha que a meta de crescimento vai ser cumprida, eu dou graças a Darwin que você existe, porque alguém tem que ficar na ponta que perde de minhas apostas.


”DK, acho que ainda estamos muito longe dessa exuberância irracional toda que parece, corretamente, te preocupar.”

Fumou crack com cocô de avestruz? Nós já saímos da fase da exuberância irracional para a fase de desalavancagem, crescimento baixo, risco de estagflação e perda de competitividade.

Drunkeynesian disse...

Hahahahaha, não entro na outra ponta jamais... A "meta" parece acima do crescimento potencial, nesse mundo de desalavancagem que você descreveu. O que pode-se fazer é, por acidente ou não, conseguir acelerar a inflação e cumprir com 10% de crescimento nominal. Seria caótico.

Eu acho que tem risco do governo aqui criar quase deliberadamente uma bolha de crédito, cortando muito os juros e incentivando diversas modalidades de empréstimo. Por enquanto ainda está longe disso, e não sei se aqui reunimos as outras características pra criar uma bolha desse tipo. Lá fora parece ser o que você descreveu, mesmo a volta do pêndulo das últimas décadas.

Jorge Browne disse...

"E se você acha que a meta de crescimento vai ser cumprida, eu dou graças a Darwin que você existe, porque alguém tem que ficar na ponta que perde de minhas apostas."

Bom, se eu e tu soubéssemos qual é a meta até daria para apostar. De qualquer forma o ponto é que ela, de uma forma ou de outra, existe.

"Fumou crack com cocô de avestruz? Nós já saímos da fase da exuberância irracional para a fase de desalavancagem, crescimento baixo, risco de estagflação e perda de competitividade."

Não fumei não! Tu ainda não me passou a receita hehe... Sério "O", essa é uma preocupação do DK, da qual não compartilho a intensidade, mas sim o mérito aqui no Brasil. No mundo é isso aí mesmo.

DK, ao que parece o governo está menos preocupado com a convergência à meta no curto prazo do que com o baixo crescimento.

Drunkeynesian disse...

De fato parece mais preocupado com crescimento do que trazer a inflação rápido pra meta. E hoje está uma discussão estranhíssima sobre a mudança na composição do IPCA, quando me informar direito, escrevo aqui.

Fernando A. disse...

Teoria da conspiração sobre a mudança no IPCA: reduzir o peso dos itens que serão impactados pelo salário minimo a partir do inicio de 2012.

Drunkeynesian disse...

Do que ouvi até agora concluo que o mercado fez muito barulho por nada, a mudança nos pesos já era esperada há algum tempo. Veremos...