Após a decisão de ontem do FOMC, é difícil não pensar que o Fed ainda vai demorar um bom tempo para sair da sombra de Alan Greenspan - cujos editores, por sorte ou oportunismo, optaram por lançar "A era da turbulência", sua biografia oficial, exatamente no dia anterior da decisão de política monetária mais importante dos últimos anos. A impressão que se tinha, reforçada pelo discurso de Ben Bernanke na conferência de Jackson Hole* (onde ele afirmou que "não é responsabilidade do Fed - nem seria apropriado - proteger fornecedores de crédito e investidores das consequências de suas decisões financeiras), é que o Fed atual queria acabar com a chamada "Greenspan Put", a impressão dos agentes de que, depois de uma determinada queda nos preços de ativos, o Fed sempre correria para socorrer os mercados, como se os ativos carregassem uma opção de venda implícita, ou, em outras palavras, um limite para suas desvalorizações. Com o corte de 0,5% na taxa básica de juros, por mais que este seja futuramente justificado pela fraqueza da economia americana, a impressão que se tem é que a "Greenspan Put" continua viva e muito bem, obrigado.
Muito já se falou que esse comportamento assimétrico do Fed - deixar que preços de ativos se valorizem livremente e, quando essa valorização começar a se reverter, cortar os juros rapidamente - estimula a criação de bolhas. Embora eu não concorde com essa noção (não acho que seja papel de um banco central se preocupar com preços de ativos, e tenho dúvidas que um estouro de bolha induzido seja menos danoso do que quando este ocorre de forma natural), a impressão que tenho é que ou o Fed ou os mercados estão cometendo um grave erro de leitura da conjuntura atual: uma economia americana que precisa de um corte de meio ponto percentual nos juros básicos parece estar sob um risco considerável de recessão (visão do Fed), o que não condiz com o S&P 500 a apenas 1,7% de sua máxima histórica. Ou seja, os próximos dados econômicos ou corroborarão a festa dos mercados por conta da antecipação da queda dos Fed Funds em direção a sua taxa neutra (que deve ser algo em torno de 4%, pela regra de Taylor) ou darão razão ao Fed e trarão mais turbulência para os preços de ativos. Façam suas apostas.
* Impressionante a capacidade de síntese e de criar termos pomposos da língua inglesa. Imagine se o banco central brasileiro resolvesse promover uma conferência em um lugar chamado "Buraco do Filho do Zé".
quarta-feira, 19 de setembro de 2007
A sombra de Greenspan
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