sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Tchau, 2010

Adeus para um ano difícil. Este blog volta, mais queimado de sol e com alguns dias de ressaca acumulada, em 2011. Aproveito para agradecer os pacientes leitores e desejar um ano novo bestial a todos.

Som (natalino) da Sexta - Otis Redding

Merry Christmas, Baby.

Árvore de Natal

Cortesia do Credit Suisse. Era só ter comprado algodão e vendido gás natural. FÁCIL!

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Minhas previsões para 2011

Quem acompanha o blog sabe o quanto eu sou crítico de previsões (concordo com o Yogi Berra: "It's tough to make predictions, especially about the future."), mais ainda das que envolvem números, mais ainda se esses números tiverem alguma casa depois da vírgula. Para o meu trabalho, porém, fazer previsões é um exercício quase necessário, sempre sabendo que os fatos devem mudar as opiniões e que meus clientes não me pagam para eu estar certo. Aí vão algumas coisas que acho que vão acontecer durante 2011, que podem ou não ter algum valor para quem opera no mercado financeiro:

- Os juros longos no Brasil vão continuar caindo, possivelmente para os níveis mais baixos da história.

- A inflação no Brasil será mais baixa do que o mercado prevê.

- Mais algum banco médio brasileiro vai ter problemas com a carteira de crédito.

- As ações de bancos na Europa vão seguir caindo. Possivelmente alguns bancos grandes serão nacionalizados ou receberão ajuda dos governos.

- A União Européia vai garantir a dívida de todos os seus membros. Dessa forma, o esfacelamento do euro que eu achava que ia ocorrer vai ser adiado, até que algum país não aguente mais conviver com uma moeda valorizada.

- O Brasil vai começar a ter problemas com financiamento externo. O real vai se desvalorizar. As reservas internacionais vão parar de crescer.

- A bolha do ouro e da prata vai estourar; o preço de ambos cairá pelo menos 20%.

- Vender volatilidade nos picos vai novamente ser uma estratégia ganhadora. O mercado caminha para cada vez mais preços controlados.

- A carteira de crédito do BNDES vai começar a ter problemas. Talvez demore mais do que um ano, mas a JBS não vai se aguentar.

- Não terminarão o ano acima dos preços máximos deste ano as ações de: Apple, Netflix, bancos brasileiros, índice do México, índice da Alemanha. E, sinto informar, o Facebook não vale US$ 40 bilhões.

- Preços de imóveis em São Paulo e Rio de Janeiro vão seguir altos (e, possivelmente, subindo).

- Eike Batista vai seguir vendendo promessas. Guido Mantega vai continuar falando asneiras. Ben Bernanke vai seguir imprimindo. Eu vou seguir reclamando.

- Vai ficar cada vez mais claro o quanto Lula foi sortudo. E a culpa vai ser colocada em dona Dilma. É do jogo...

- Vou errar pelo menos metade das previsões acima. Espero não perder leitores por isso. Saravá!

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Os melhores livros de 2010

Se eu mal consigo acompanhar os filmes na medida em que eles estream no cinema, com os livros é ainda pior. Este ano consegui ler mais do que em 2009 (mesmo não considerando as releituras das histórias do Asterix), mas ainda assim a pilha só cresceu. De qualquer maneira, aí vai o que me chamou a atenção em 2010:

Economia, mercados e afins:

- The Big Short: Inside the Doomsday Machine, Michael Lewis (W.W. Norton, 2010)

Escrevi uma resenha aqui. Para quem trabalha no mercado, uma lição sobre paciência e como bolhas podem ser resilientes.

- Invisible Hands: Hedge Funds Off the Record - Rethinking Real Money, Steve Drobny (Wiley, 2010)

No mesmo molde de entrevistas dos clássicos Market Wizards e do livro anterior de Drobny (Inside the House of Money), só que preservando a identidade dos entrevistados. A tese (corajosa) de Drobny é que o dinheiro dos fundos de pensão deveria fugir da pseudodiversificação em instrumentos parecidos com ou mais arriscados que ações e ser gerido como os ativos de fundos de hedge, com extrema flexibilidade. Talvez a tese seja correta, mas, ainda assim, creio que faltariam gestores talentosos como os retratados no livro (alguns, como Hugh Hendry, são facilmente identificáveis). De qualquer forma, traz algumas grandes histórias e insights.

- The Little Book of Behavioral Investing, James Montier (Wiley, 2010)

Vale mais do que qualquer curso de finanças na universidade. Fala dos mercados e dos investidores como eles são, e não como deveriam ser no mundo da normalidade.

- More Money Than God: Hedge Funds and the Making of a New Elite, Sebastian Mallaby (Penguin, 2010)

Quatro anos de pesquisa foram necessários para montar uma grande história dos fundos de hedge e dos egos e ideias por trás deles. O pecado (menor) é praticamente só falar dos fundos americanos.

- The Soros Lectures, George Soros (PublicAffairs, 2010)

Um dos maiores especuladores da história fala sobre sua visão do mundo. Resenhei aqui.

- Mobs, Messiahs, and Markets, William Bonner e Lila Rajiva (Wiley, 2009)


Às vezes pedante a ponto de irritar, mas uma boa alternativa contemporânea para o clássico Extraordinary Popular Delusions and The Madness of Crowds.

- How to Lie With Statistics, Darrell Huff (W.W. Norton, 1993)

Quase 50 anos se passaram da primeira edição deste livro (de 1954). A quantidade de dados disponíveis se multiplicou algumas vezes; o mau tratamento deles (intencional ou não) segue o mesmo.

- Dance with Chance, Spyros Makridakis, Anil Gaba e Robin Hogarth (Oneword, 2009)

Soa um pouco como autoajuda, mas é muito bem embasado e ensina a fugir de médicos. Vale a leitura, portanto.



Temas menos mundanos:


- O Pequeno Livro do Rock, Hervé Bourhis (Conrad)

- Divertido, apaixonado e bem desenhado (e ousa achar Grandaddy melhor que Radiohead).

- Playing the Enemy, John Carlin (Penguin)

O livro que inspirou Invictus, do Clint Eastwood. História que se lê como um bom romance.

- As Cruzadas Vistas Pelos Árabes, Amin Maalouf (Brasiliense)

Consegue, ao mesmo tempo, defender os árabes e criticar duramente sua decadência. O trabalho de pesquisa, em fontes da época, deve ter sido insano.

- Six Easy Pieces, Richard P. Feynman (Penguin)

Física é para os fortes. O primeiro livro do Feynman que leio; ele realmente devia saber muito para conseguir fazer com que coisas completamente abstratas pareçam minimamente simples.

- Reflexões Sobre um Século Esquecido, Tony Judt (Objetiva)

A lucidez de Judt fará muita falta. Felizmente sua obra seguirá a nosso alcance.

- What Have You Changed Your Mind About?, John Brockman (Harper Perennial)

Tem tantas ideias interessantes que pode ser material de reflexão para a vida inteira.

- Autores de Guias de Viagem Vão Para o Inferno?, Thomas Kohnstamm (Panda)

Sexo, drogas e caipirinha. E, nas horas vagas, escrever um guia de viagens para o Brasil. Deixou a editora do Lonely Planet puta da vida, só por isso já valeria a leitura.


Ficção

- Uma Breve História dos Tratores em Ucraniano, Marina Lewycka (Bertrand Brasil)

Comprei pelo título e pela capa, saí no lucro. Além do aprendizado sobre a história dos tratores nos tempos de Stalin, ganhei uma história original, muito bem contada, divertida e humana.

- The Brief Wondrous Life of Oscar Wao, Junot Díaz (Riverhead Trade)

A história (de um adolescente de origem dominicana, nascido nos EUA e sofrendo o diabo no país dos pais) é miserável, mas rendeu, ao invés de um dramalhão, uma comédia de humor negro contundente e muito bem escrita.

- Pornopopéia, Reinaldo Moraes (Objetiva)

Mais um herói sem caráter para a história da literatura brasileira. Mais na piauí deste mês.

- Freedom, Jonathan Franzen (Farrar, Straus and Giroux)

O livro mais comentado deste ano nos EUA. Merecia um texto maior aqui, ainda vou fazer. Talvez seja o livro que vai definir uma geração.


E ficaram para o ano que vem (e para o outro... o outro... o outro...):

As palavras de 2010

Entre os 10 termos mais consultados no dicionário Merriam-Webster este ano, estão "austeridade", "moratória" e "socialismo". O mundo não anda muito auspicioso, mesmo.

Via Planet Money (a foto também roubei de lá).

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Seus problemas acabaram

Vendeu a descoberto e o papel não cai?


Como funciona?


"Garantia e seriedade". Claro. E você pensa que só vale para as ações pouco negociadas?



Mais de 2% em Petrobras? Ouch...

Interessados, dirijam-se ao Mercado Livre. A CVM também podia resolver passar por lá.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Os melhores filmes de 2010

Entre os filmes que estrearam no Brasil em 2010, este palpiteiro amador gostou muito de (em ordem alfabética):

- Direito de Amar (A Single Man) - Tom Ford

Daria para desconfiar da estreia de um estilista como diretor de cinema, mas Tom Ford acertou em quase tudo, do roteiro à escolha do ótimo (e pequeno) elenco. Colin Firth merecia o Oscar que foi para Jeff Bridges.

- Guerra ao Terror (The Hurt Locker) - Kathryn Bigelow

Para um filme difícil sobre um tema difícil levar um Oscar, os méritos não podem ser poucos. Na verdade mereceria destaque só por ter roubado a festa de Avatar e dado alguma esperança para quem quer continuar vendo simplesmente boas histórias bem contadas na tela.

- Ilha do Medo (Shutter Island) - Martin Scorsese

A parceria Scorsese-Di Caprio não para de funcionar. E este foi o ano em que me rendi ao Mark Ruffalo (por Ilha do Medo e...)

- Minhas Mães e Meu Pai (The Kids Are All Right) - Lisa Cholodenko

Famílias felizes são todas parecidas, mesmo quando têm duas mães. O feel good movie do ano.

- A Partida (Okuribito) - Yojiro Takita

Uma reflexão nada piegas sobre morte e dignidade. A trilha sonora, de Joe Hisaishi, é fabulosa.

- O Profeta (Un prophète) - Jacques Audiard

Quem acha que filme francês precisa ser sonolento ou metido a intelectual deveria gastar duas horas e meia (que passam em um estalo de dedos) para ver esse épico. Talvez o melhor filme desta lista.

- A Rede Social (The Social Network) - David Fincher

A vontade depois de sair do cinema foi de apagar minha conta no Facebook. Depois, inspirou uma boa reflexão sobre os nossos tempos. Talvez vá definir uma geração, talvez no ano que vem já estejamos falando de outra "revolução" digital.

- O Segredo dos Seus Olhos (El secreto de sus ojos) - Juan José Campanella

Acredite no hype, é um filmaço. Campanella soube aprender com os americanos sem perder o lado bom de ter nascido ao sul do Equador. A sequência no estádio de futebol é absolutamente memorável.

- Soul Kitchen - Fatih Akin

Um dos cineastas mais interessantes com menos de 40 anos dá um tempo nos filmes sérios e volta ao pastelão de Kebab Connection, sem perder a classe ou abandonar os temas de que tem tratado tão bem - os tipos marginais de Hamburgo, a difícil integração de imigrantes turcos e gregos na Alemanha e a boa música.

- Tropa de Elite 2 - José Padilha

Outro que vale o hype. Uma grande homenagem de Padilha ao ídolo Costa-Gavras.

- Tudo Pode Dar Certo (Whatever Works) - Woody Allen

O clássico papel de Woody Allen com um ator algumas vezes melhor. Poucas vezes o mau humor foi tão divertido.

- Vincere - Marco Bellocchio

Bellocchio continua contando com maestria a história da Itália.

- Zona Verde (Green Zone) - Paul Greengrass

Bourne vai ao Iraque. Deve ter deixado bastante gente irritada no Pentágono.

Ainda estou me devendo A Origem (Christopher Nolan) e Carlos (Olivier Assayas), que, pelo o que ouvi, também estariam nesta lista. A menção honrosa vai para a boa volta de Francis Ford Coppola em Tetro.

Leituras da segunda-feira

Hoje é a última segunda-feira útil do ano para este escriba.

- O monstro JBS não para de crescer. Pior para o contribuinte brasileiro (Folha).

- O mercado está percebendo que conceder crédito no Brasil não é tão bom negócio assim (Bloomberg).

- Howard Marks discorre sobre o ouro (Zero Hedge).

- Os investidores da bolsa de Dhaka, Bangladesh, estão revoltados porque as ações caíram 6,7% em um dia - depois de terem subido 80% no ano (!!!) (BBC).

- A vitória dos zumbis, por Paul Krugman (NYT).

- Os filmes do ano para Wall Street (NYT).

- Bernanke vai à guerra (Barry Eichengreen).

- Os japoneses são mesmo diferentes de eu e você: ceia de Natal no Japão é sinônimo de KFC. A rede vende nos dias 23, 24 e 25 de dezembro o equivalente à metade das vendas de um mês normal (Financial Times).

- Espere o inesperado: projeções pouco usuais do dinamarquês Saxo Bank (Financial Times). Muito mais interessante do que dizer que a Bovespa vai subir 18% (12% de juros + 6% de prêmio).

- Porque é difícil interpretar números de balança comercial (Ultimi Barbarorum).

- Gráfico do dia: Dow Jones em 2010 (Barron's, clique para aumentar):


- Vídeo do dia: Nassim Taleb na Bloomberg (The Big Picture).

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

O Lulismo vai à academia ou: Doutor é quem faz doutorado

(Agora) Doutor Mercadante inaugura mais um episódio na era da sabujice brasileira:

Futuro ministro da Ciência e Tecnologia no governo Dilma, o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) defendeu nesta sexta-feira (17), no Instituto de Economia da Unicamp, em Campinas (SP), tese de doutorado sobre a política econômica do governo Lula. Depois de quatro horas de debates, a tese de 519 páginas foi aprovada, mas recebeu críticas da banca, formada pelos economistas Delfim Netto, Luiz Carlos Bresser Pereira, Ricardo Abramovay e João Manuel Cardoso de Mello.
(...)
Sua tese defende a ideia de que o governo Lula estabeleceu um novo modelo de crescimento econômico, o “neo-desenvolvimentismo”, diferente do “nacional-desenvolvimentismo”, que vigorou na década de 70, e do neoliberalismo, a partir dos anos 90. Este novo modelo, disse, se construiu a partir do primado da política social sobre a econômica.

Mais no UOL.

Som da Sexta - Amy Winehouse + Quincy Jones

Do disco novo de Quincy Jones. 47 anos depois, Amy Winehouse substitui Lesley Gore na marrenta It's My Party. Grande arranjo (padrão Quincy Jones de qualidade), e dona Amy de fato tem talento.

Foto do dia - Keynes

Nunca tinha visto a foto inteira do avatar deste blog:


quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Rasgando a cartilha

Economia bombando? Inflação subindo? Corte juros. Foi o que a Turquia fez hoje, tentando desencorajar a entrada de capitais de curto prazo que valorizam o câmbio. A cartilha de operação dos bancos centrais que foi usada durante a última década está sendo rapidamente abandonada. 2011 promete ser um ano muito interessante nesse campo.

Mais no Financial Times.

Gráficos do dia - Brasil vai às compras

Cortesia do BNP Paribas: os termos de troca do Brasil (grosso modo, razão entre o preço do que exportamos e o que importamos) nunca estiveram tão altos. Como consequência, as importações estão explodindo. Como commodities vão subir para sempre, não há nenhum problema à vista.

Leituras do dia (mais um chuvoso em SP)

Como previsto, está difícil produzir conteúdo original este mês:

- Os brasileiros estão consumindo mais cerveja e menos arroz e feijão, diz o IBGE (UOL).

- "Latvia slashed state salaries by 35% and the number of public agencies by half. It also closed half of its excessive number of hospitals and sacked superfluous teachers, of which there was one for every six children before the crisis." Ouch. Anders Åslund fala sobre como o ajuste nominal na Europa tem sido bem melhor sucedido do que se esperava (Project Syndicate).

- O Twitter "vale" US$ 3,7 bilhões (Bloomberg). Vem aí a bolha da Internet 2.0.

- Como escrever o obituário do euro (The Telegraph).

- Conheça Hawa Abdi, "metade Madre Teresa, metade Rambo" (Nicholas D. Kristof para o NY Times).

- O tesouro espanhol descansa, após um ano não exatamente fácil (Bloomberg).

- Leite humano à venda. Vestido de carne. Megalagosta. A democratização da macroeconomia. As ideias de 2010, pelo NY Times.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

O mundo, de acordo com o Facebook

Arrisca algum tecnocrata olhar pra esse mapa e criar um programa do governo para que o Norte e o Nordeste fiquem mais iluminados. Via Link.


P.S. O mapa foi feito por um estagiário do Facebook. Mostre para seu estagiário toda vez que ele reclamar que o trabalho está muito difícil. Mais na The Economist.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Uma crítica de Wall Street - O Dinheiro Nunca Dorme

De vez em quando alguém me pergunta o que achei do Wall Street - O Dinheiro Nunca Dorme (Wall Street 2, daqui pra frente). Só fui ver o filme semana passada, então minha opinião provavelmente não vai ter nada de original. De qualquer forma, vamos lá (se você não viu o filme e pretende fazê-lo, talvez seja boa ideia deixar este texto para depois):

Ideologias à parte, Oliver Stone é um puta cineasta, o que talvez tenha ficado esquecido nos micos que ele fez nesta década (Alexander, World Trade Center, W, South of the Border. Além disso, ele escreveu "a porra do roteiro de Scarface", como fez questão de contar para o Shia LaBeouf durante as filmagens deste filme). Wall Street 2 nos lembra disso: as 2h15 do filme passam rapidinho. Ele sabe como contar uma história, o elenco é fantástico, o personagem Gordon Gekko ainda é sensacional e a música do David Byrne e do Brian Eno casou muito bem com as imagens de Nova York, mesmo quando aparecem aqueles efeitos meio cafonas de prédios se misturando com dominós caindo. Paro por aqui o comentário "artístico", já que, imagino, ninguém queria saber desse tipo de opinião quando me perguntavam do filme.

Para quem viveu a crise de 2007/2008 trabalhando no mercado financeiro, as cenas dos banqueiros reunidos com o tesouro e o Fed são uma grande atração, e parecem bastante verossímeis. Na primeira delas, o banco ficcional Churchill Schwartz (uma mistura dos reais Goldman Sachs e JP Morgan) coloca na parede o problemático Keller Zabel (referência óbvia a Bear Stearns), forçando sua venda a US$ 3 dólares por ação e provocando o suicídio de seu presidente, Louis Zabel. Na segunda, é o Churchill Schwartz (e o resto do sistema financeiro) que imploram (ou chantageiam) por ajuda para o Fed e o Tesouro, que, como na vida real, reconhece que os bancos são grandes demais para irem à falência e os salvam (também há personagens que são referências evidentes a Hank Paulson e Tim Geithner). Mas isso tudo é secundário. Os grandes temas do filme são redenção e renovação.

Gordon Gekko acaba de passar oito anos preso pelas fraudes cometidas no primeiro filme. Dedica-se, inicialmente, a vender livros e dar palestras, até descobrir uma maneira de conseguir sacar os US$ 100 milhões que deixou sob custódia da filha (Winnie) antes de ir para a cadeia. Com os US$ 100 milhões, como George Soros, volta da aposentadoria para operar em um mercado caótico, porém cheio de oportunidades. No final do filme, os US$ 100 milhões viraram US$ 1 bilhão, e Gekko pode devolver o dinheiro para Winnie, que o usa para investir em uma companhia de energia limpa na qual Jake, seu noivo, acredita. Gekko está redimido, e o dinheiro ganho com o estouro de uma bolha é renovado e usado para um projeto inovador e benéfico para a humanidade. O filho de Winnie e Jake nascerá em um mundo melhor.

Jake Moore, o genro de Gekko, choca-se com o suicídio de Louis Zabel, seu mentor no trabalho, e decide trabalhar para o Churchill Schwartz. Ultrajado por saber que a companhia de energia limpa que ele apoiava foi preterida em um investimento de chineses por não trazer benefícios para os executivos do banco, Moore decide preparar e publicar um dossiê envolvendo Bretton James, o presidente da Churchill Schwartz, em uma série de fraudes que visavam lucrar com a queda do Keller Zabel. James é demitido e deve responder a um processo. O suicídio de Louis Zabel está vingado.

No mundo criado por Stone, há espaço para redenção, renovação e justiça. O dinheiro capturado oportunamente após o estouro da bolha financeira é usado para financiar projetos ecologicamente corretos. O banqueiro que leva sua instituição à falência vê como única saída honrosa o suicídio. O outro banqueiro, inescrupuloso, é desmascarado e punido. Gordon Gekko, depois de um longo período na cadeia, está pronto para voltar ao mercado, contando apenas com suas habilidades e com objetivos mais nobres. Até Bud Fox (Charlie Sheen), a cria de Gekko do filme de 1987, encontrou sua redenção: transformou a companhia aérea em que o pai trabalhava em um negócio lucrativo, ficou multimilionário e agora dedica-se à "garotas, invernos em St Barts e filantropia".

Stone é um idealista: pintou o mundo como ele gostaria que fosse. A vida real, como sabemos, é bem diferente. O estouro das bolhas, por enquanto, não implicou em renovação, mas sim em desculpa para uma gigantesca transferência de dinheiro do contribuinte para uma classe de plutocratas, sem maiores consequências para os envolvidos. A mensagem relativamente otimista do final do filme, com crianças brincando com bolhas, não encontra correspondência em uma sociedade que parece cada vez menos se preocupar com as próximas gerações.

Quando fez o primeiro Wall Street, Oliver Stone queria fazer uma crítica à cultura inescrupulosa dos anos 80. Acabou inspirando uma geração de pretensos Gordon Gekkos, loucos por dinheiro, influência e poder. Desta vez, creio, a tentativa é de criar, em Jake Moore, um modelo para os recém entrados no mercado de trabalho. Temo, entretanto, que a figura que pode emergir do filme como inspiração é a do cínico Bretton James (papel de Josh Brolin) que opera na área cinzenta entre crime e legalidade, dá-se ao luxo de destruir um original de Goya num momento de fúria e, apesar de ter a sorte consideravelmente pior do que muitos dos executivos envolvidos na crise e perder o emprego, não tem sua fortuna ameaçada (talvez tenha, numa sequência). Essa história ainda está sendo contada, e, talvez, a visão relativamente otimista do cineasta ainda se prove correta. Infelizmente, por enquanto, as evidências apontam para o contrário.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Brasil no 60 Minutes da CBS

Não dava para esperar muito de um programa feito para o americano médio. Mas acho que eu preferiria, no lugar do Eike Batista e do Eduardo Bueno, o Romário e o Zeca Pagodinho fazendo as vezes de embaixadores do Brasil.

Leituras da segunda-feira

- Um grande país vende soja e compra laptops (ambos tendo a China como contraparte). Não é o Brasil (Andrew Leonard).
- O mundo de acordo com Hugh Hendry (Investment Week).
- 145 minutos com Nassim Taleb (New York Magazine, via Solon's Warning).
- Leonardo Monasterio entra para a nobre lista de economistas brasileiros que visitaram a Etiópia.
- Gato vs internet, disputa injusta (The Oatmeal).

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Som da Sexta - Rudresh Mahanthappa

Esse saxofonista de ascendência indiana, nascido na Itália e radicado nos EUA é das coisas mais interessantes que ouvi nos últimos anos.

Gráfico do dia - Propina, bola, cervejinha, arrego

É bom não ver o Brasil em tão má companhia num estudo desse tipo (mais na The Economist):

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Leituras do dia

- Nassim Taleb imitando Kanye West? Eric Falkenstein explica.
- Barry Eichengreen diz que a Europa precisa de um Plano Brady. Falta aparecer o novo Nicholas F. Brady.
- O canto do cisne de Meirelles. Tchau e benção.
- O discurso de Mario Vargas Llosa ao receber o Nobel de literatura.
- Os livros do ano, pela The Economist.
- Até a Esther Duflo deve ter se surpreendido vendo sua metodologia de experimentos com grupos de controle aleatórios sendo aplicada em Nova York. Ou a metodologia de fato é muito boa, ou algo nos EUA está se tornando assustadoramente parecido com a África subsaariana. Ou as duas coisas. No New York Times, dica do João Marcus. Nos EUA, claro, as considerações éticas da metodologia chamam mais atenção.

2010 foi o ano de...

Saiu o Google Zeitgeist 2010. No ano, os usuários do Google foram atrás de chatroulette, iPad, Justin Bieber e Nicki Minaj. A gripe suína passou.



Update: enquanto isso, no Brasil:

Update 2: agora em vídeo:

Gráfico do dia - Povo x Fed

Pesquisa da Bloomberg com a opinião dos americanos sobre o Fed:

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

30 anos sem John Lennon

E por hoje vai ser só isso... dia difícil.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Quebrando o gelo

A Islândia está saindo da recessão, nota Paul Kedrosky, com o padrão de vida de volta a 2003 (ver a matéria do NY Times). Nada mal para o abismo que se anunciava há poucos meses.

E Tyler Cowen discute quão efetivamente rica é a Irlanda. Talvez neste caso o desfecho não seja tão favorável quanto o da terra do gelo.

Gráfico do dia (II) - PISA x PIB per capita

Juntando os dados do PISA com o log do PIB per capita dos países (em dólares, ajustado pelo poder de compra). Sempre vai haver a discussão de casualidade, mas os dados seguem mostrando que é raro as duas variáveis andarem separadas (a China, pelo desempenho excepcional nos testes e o Qatar são os outliers).

Gráfico do dia - PISA

Saíram hoje os dados do último PISA (Program for International Student Assessment), um estudo feito pela OECD que compara o desempenho de estudantes de 15 anos de 65 países em testes padronizados de matemática, leitura e ciências:


A tabela com os dados separados por exame pode ser vista no Wall Street Journal. Mais sobre o Brasil na Folha.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Discriminação de preços

Preço dos ingressos para os shows do Vampire Weekend no Brasil:

Porto Alegre - R$ 50
Rio de Janeiro - R$ 100
São Paulo - R$ 160

O fato dos paulistas estarem dispostos a pagar três vezes mais do que os gaúchos para ver o mesmo show deve dizer algo sobre o Brasil.

Eles (ele e ela) falam

Algumas entrevistas interessantes que saíram no final de semana:

- Ben Bernanke no 60 Minutes da CBS:



- Dilma, para o Washington Post.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Som da Sexta - Ornette Coleman

Porque esse senhor (80 anos completos em março) estava se apresentado no SESC Pinheiros no domingo passado, e a energia caiu, e ele e a banda pararam por dois minutos, e voltaram a tocar, no escuro, sem amplificação, esta música (que tem mais de cinquenta anos). E a plateia veio abaixo, e foi um dos momentos mais fantásticos que já vi numa apresentação de música.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

As consequências econômicas de mr. Blatter

1. Os cleptocratas russos vão ter mais um canal (dos grandes) para lavar dinheiro;

2. Um território mais de dez vezes menor que a pacífica e minúscula cidade de Heliodora-MG, perto de onde meu pai nasceu, de pouco mais da metade do tamanho de Sergipe vai construir nove estádios (além dos outros três que já existem e serão reformados / ampliados) e estrutura hoteleira para receber uma Copa do Mundo. Vem aí mais uma bolha de construção civil e um desperdício de capital de grandes proporções (no relativo ao tamanho da economia, talvez o maior da história). Vai ser interessante também ver o que a FIFA vai fazer com os patrocínios de fabricantes de cerveja e se as tradicionais musas da Copa serão convidadas a colocar um lencinho na cabeça e uma blusa de manga comprida antes de entrar nos estádios.

Cinco livros

Funciona assim: algum figurão fala de cinco livros interessantes do assunto que conhece. Você vê as listas, acha quase todos interessantes, acaba comprando alguns e fica mais pobre, mas não menos ignorante, já que a commodity escassa é tempo para ler. Pelo menos a estante fica enriquecida.

Rabugices a parte, o site é bem interessante, vai lá: Five Books. Hoje tem o Dani Rodrik recomendando livros sobre globalização.

P.S. Depois de publicar, reparei que comecei os dois posts do dia com "funciona assim". Ô mania de querer explicar para as pessoas como as coisas funcionam...

Vem aí: o carry trade português

Funciona assim: o tesouro brasileiro emite dívida que paga em reais mais 12% e compra títulos da dívida portuguesa que pagarão euros escudos mais 6,7%. Aguardamos a posição do nosso Guido Mantega sobre o assunto, e também Portugal pedindo dinheiro para Angola, Moçambique, Cabo Verde e Macau. Às armas, às armas.

No Estado: Portugal deve pedir empréstimo ao Brasil, diz chefe da Casa Real

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Economia é mesmo uma ciência de segunda categoria...

Do The Big Picture, citando o The Guardian, as dez questões que a ciência ainda precisa responder (tradução livre e porca minha):

1. O que é a consciência?
2. O que aconteceu antes do Big Bang?
3. A ciência e a engenharia darão de volta nossa individualidade?
4. Como vamos lidar com o crescimento da população mundial?
5. Há um padrão para os números primos?
6. Podemos transformar o modo científico de pensar em dominante?
7. Como podemos nos assegurar de que a humanidade sobrevivará e se desenvolverá?
8. Alguém pode explicar adequadamente o significado de espaço infinito?
9. Será possível gravar o cérebro como se grava um programa de televisão?
10. A humanidade pode alcançar as estrelas?

Nada da existência da taxa neutra de juros reais, da validade da curva de Phillips ou da propriedade da hipótese dos mercados eficientes. Eu usei "ciência" no título?

Respostas na caixa de comentários, por favor. Tentem não gastar mais de cinco linhas por questão.

Dezembro é mês de...

- Off-topic, como foi ano passado;
- Festas de final de ano e consequentes ressacas, grandes inibidoras de criatividade (portanto, não esperem nada muito brilhante e alguns textos requentados por aqui);
- Retrospectivas do ano;
- Balanços da Era Lula;
- Preguiça;
- Adoração ao deus Ano Novo, a maior religião brasileira (essa é do Ricardo Freire);
- Sazonalidade muito favorável às bolsas, tanto aqui quanto nos EUA (ver aqui).