(este texto estava pronto para ser publicado na quinta-feira; infelizmente o nosso venerável presidente do Banco Central resolveu tornar pública decisão tão importante para nossa sociedade e para a "racionalidade econômica" depois que eu já estava em ritmo de Páscoa.)
Seu Henrique Meirelles achava que o prestígio conquistado por "conduzir o país com maestria durante um período de inédita turbulência" (claro que discordo dessa afirmação tão propagada por aí, mas esse é tema para outras discussões) teria lhe garantido a opção de escolher, ao seu bel-prazer, entre ser o vice-presidente de dona Dilma, candidato ao senado por Goiás, executivo à procura de emprego no mercado financeiro ou criador de orquídeas e outras plantas ornamentais. Nos últimos meses, ele deve ter descoberto que política é uma atividade bem pouco cartesiana, e que exige um tipo de ego bastante diferente daquele de banqueiros centrais. Por isso, veremos Meirelles terminar seu mandato gloriosamente, de mãos dadas com Lula, seu quase fiel apoiador (diz Luiz Gonzaga Belluzzo que chegou a recusar um convite do Nosso Guia para assumir o Banco Central enquanto Meirelles estava lá), e como um dos poucos ministros que conseguiram sobreviver a oito anos do governo do PT.
O Banco Central que Meirelles comandará até o final deste ano é muito diferente do padrão com o qual o mercado se acostumou desde 2003. Se antes pelo menos metade da diretoria era composta por profissionais ligados ao mercado financeiro ou à PUC-RJ (quase sinônimos, ultimamente), gente de pensamento "ortodoxo" e relativamente previsível, agora a maior parte do Comitê de Política Monetária é formada por burocratas de carreira, muitos anteriormente ligados ao Ministério da Fazenda, e, leitura quase consensual, mais "influenciáveis" por fatores políticos.
Minha opinião, um pouco iconoclasta, é que o trabalho do Banco Central do Brasil como perseguidor de uma meta de inflação se assemelha a de um pescador montado numa jangada -- por mais que ele faça um trabalho excelente, muito do seu resultado dependerá de fatores aleatórios (como a maré e o tempo), e ele pode ser varrido por um tsunami ou por um transatlântico passando por perto. Dessa forma, acho que faz pouca diferença para 99,9% da população (ou seja, os que não operam diariamente no mercado de juros) o que a nova diretoria vai fazer com os juros de um dia. Passo mais importante, talvez, será dado no ano que vem, com presidente e idéias novas quanto à condução da economia. Até lá, podemos esperar as tradicionais discussões sobre a diferença que faz 0,25% de aumento na Selic distribuído ao longo de meses. Durmamos em paz e tomemos cuidado com o que realmente importa, os tsunamis e transatlânticos.
segunda-feira, 5 de abril de 2010
O Dia do Fico de Meirelles
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