sexta-feira, 31 de maio de 2013

O "novo" BC: Copom e câmbio

Geralmente não gosto de comentar política monetária no calor dos acontecimentos, mas como tem muita gente (3 pessoas) pedindo minha opinião, aí vai:

Acho que nesta semana o BC destruiu duas fortes crenças que o mercado brasileiro vinha alimentando nos últimos meses:

1. O BC de Tombini é "frouxo": vai sempre tentar segurar a taxa de juros no nível mais baixo possível, e, antes de aumentá-la, recorrerá a um repertório de medidas "macroprudenciais". Também é relativamente tolerante com a inflação, com uma banda informal entre 5,5% e 6,5% anuais. Com isso em mente, comprar NTN-Bs (títulos indexados ao IPCA) é das melhores operações: no cenário-base, a inflação é alta com a Selic parada, o que garante um bom carregamento (juros reais + inflação x Selic). Caso a inflação acelere, o BC relutaria em subir os juros básicos, e o carregamento continuaria bom. E, na improbabilidade da inflação cair, o BC voltaria a cortar os juros.

2. A taxa de câmbio no Brasil é controlada: se a cotação do dólar subir muito, o BC intervem num teto informal próximo a R$2,05/US$. O controle do câmbio é ferramenta fundamental no controle da inflação, mais ainda em um cenário de juros artificialmente baixos.

A crença #1 foi destruída com o resultado da reunião do Copom da última quarta-feira, quando, por unanimidade, o comitê acelerou a alta dos juros mesmo com o IBGE mostrando crescimento do PIB abaixo do esperado algumas horas antes. Tombini passou de "Pombini" para "águia", e agora o mercado passa a levar mais a sério o combate da inflação via política monetária. Os compradores de NTN-B estão sendo destruídos, já que o pior e "menos provável" cenário está se concretizando: inflação caindo com Selic em alta. Fica para um próximo post comentar sobre a barbeiragem que a regulação de fundos de previdência cometeu, forçando os gestores a alongar carteiras a preços com baixíssima margem de segurança (combinação de juros de mercado baixos + inflação esperada alta), como se mais risco implicasse necessariamente em mais retorno.

A crença #2 acabou com o mercado vendo o câmbio reais / dólares, ao longo do mês, chegar a 2,0, 2,05, pqp, cadê o BC?, 2,10 e 2,14 enquanto escrevo. Neste caso, curiosamente, 9 entre 10 economistas achavam que o real deveria se depreciar, já que os fundamentos (fluxo externo) pioraram muito e o dólar entrou em trajetória de alta contra quase todas as moedas de emergentes e/ou produtores de commodities. Ocorre que o BC, sentado em cima de US$370 bilhões em reservas, aparentemente controlava o mercado no curto prazo, o que impedia os fundamentos de prevalecerem. A percepção que segue, portanto, é que o dólar só subiu porque o BC assim o quis. O discurso oficial deve ser de um alinhamento com o movimento das demais moedas (ver a entrevista de Tombini na Folha de hoje, por exemplo), o que faz bastante sentido e seria natural se o câmbio fosse de fato flutuante; o que parece estranho é o timing, mais ainda considerando que a depreciação forçada do final do ano passado foi vista como um erro, ao impedir que a inflação se beneficiasse de uma queda no preço em dólares de várias commodities.

A combinação de câmbio mais depreciado e juros mais altos soa como um ajuste ortodoxo necessário, mas que, num cálculo político (no qual eu acreditava), seria empurrado para depois das eleições presidenciais do ano que vem, já que arriscaria comprometer algumas bandeiras eleitorais importantes (consumo, juros na mínima histórica e inflação, considerando que a depreciação do câmbio tem efeito mais rápido do que a alta dos juros). Ainda não consigo tirar uma conclusão, mas talvez o contínuo fraco desempenho da economia (ao menos se medido pelo crescimento do PIB) pode ter levado a presidente a autorizar uma mudança grande na orientação da política econômica. Isso implicaria em um BC com mais poder e Fazenda com menos relevância (o que parece estranho depois do "alquimista" Arno Augustin aparentemente ter ganhado uma longa briga contra o mais pragmático Nelson Barbosa). A ver o que ocorre nos próximos meses.

24 comentários:

Anônimo disse...

Agora sim é que ficou confuso, antes estava claro que era frouxo. Agora eu não tenho certeza.

JGould disse...

Só isso aqui já me basta para acreditar que ele é frouxo mesmo: "... mas talvez o contínuo fraco desempenho da economia (ao menos se medido pelo crescimento do PIB) pode ter levado a presidente a autorizar uma mudança grande na orientação da política econômica."

Uma pergunta? A esquizofrenia dos "reverse repos" vão continuar?

Anônimo disse...

O Drunk, me parece que vc está esquecendo de um detalhe: os passivos dos fundos de pensão são longos e indexados à inflação. Quando eles alongam a carteira, eles não estão tomando risco, mas sim zerando risco!!! O neutro para eles é ter a carteira longa. A barbeiragem aí foi ter tomado esse risco por tanto tempo.

Drunkeynesian disse...

Por essa premissa a melhor gestão é sempre passiva... vejo por outro lado: o passivo é longo e conhecido, e o jeito de fazer o ativo encontrar o passivo é operar de forma oportuna. Há grande diferença entre comprar NTN-B a 6,5% e a 3%.

Anônimo disse...

Você pode fazer como quiser pra se desviar do neutro, tomar o risco que quiser, do tamanho que quiser. Mas o fato é que o neutro é ficar comprado em NTN-B longa. Se não fizer isso e o cenário mudar para um cenário de juros baixos, você não pagará o passivo.

Drunkeynesian disse...

O problema é que ano passado ficar no neutro também não garantia a meta atuarial... e a solução foi tomar mais risco (mais duration, mais crédito) achando que isso ajudaria.

Anônimo disse...

"(o que parece estranho depois do "alquimista" Arno Augustin aparentemente ter ganhado uma longa briga contra o mais pragmático Nelson Barbosa)"

Difícil entender porque tanta gente acreditou nessa balela. O Nelson é um doido varrido, só olhar a produção acadêmica do bruto.

http://ideas.repec.org/e/pba98.html

abs

Drunkeynesian disse...

Da minha parte, toda vez que vi ele falando de política econômica, parecia ponderado e realista.

mauricio disse...

"2. A taxa de câmbio no Brasil é controlada: se a cotação do dólar subir muito, o BC intervem num teto informal próximo a R$2,05/US$. "


vê-se que essa crença permace intacta, uma vez da intervenção (frustrada) de trazer o dolar abaixo de 2.14, que chegou a 2.11, mas acabou voltando.

não foi a crença que caiu por terra, mas sim a banda que se tornou mais larga

Drunkeynesian disse...

É um jeito de ver - resta saber qual vai ser o novo padrão de atuação. Alguma pista?

Anônimo disse...

Não dá pra levar a sério um cara que escreve e assina frases como:

Não obstante as dificuldades iniciais, o PAC é um sucesso não só na aceleração do crescimento econômico, como mencionado anteriormente, mas também no aumento da taxa de investimento da economia.

ou então

O ataque especulativo de 2002 tem basicamente duas interpretações
políticas. A primeira, mais próxima daqueles identificados com o governo anterior e com o mercado financeiro, encara a forte depreciação do real e o corte
no financiamento externo do Brasil como uma resposta “racional” dos
investidores às posições históricas do Partido dos Trabalhadores (PT) contra os interesses do mercado financeiro, sobretudo no tocante à estabilidade dos contratos e à manutenção de altas taxas de juro por parte do Banco Central. O
principal problema desta interpretação está no fato que, durante a campanha
presidencial de 2002, o então candidato Lula sinalizou claramente que seu governo respeitaria os contratos vigentes e restabeleceria o controle da inflação e
da dívida pública. A segunda, mais próxima daqueles identificados com o governo Lula e com os movimentos dos trabalhadores, observa, antes de tudo, o
ataque especulativo contra o real no segundo semestre de 2002 como uma forma de limitar as opções disponíveis ao novo governo, sobretudo quando ficou cada vez mais clara a vitória do PT nas eleições presidenciais daquele ano.

hahha

Blog para receber econoespaco disse...

Continuo achando o Tombini um frouxo marionete. Subir a Selic em 0,5% quando a inflação bateu no teto MÁXIMO era o mínimo que poderia fazer. Essa medida ele deveria ter tomado meses atrás, quando o IPCA começou a se distanciar da meta.

Agora teremos que lutar contra uma inflação inercial por algum tempo.

Anônimo disse...

Drunk,
é fácil ver o dólar subindo e falar de fundamentos e etc, mas ninguém fala mais sobre a ABERRAÇÃO do IOF para vendidos acima de R$ 10 MM...

Anônimo disse...

Reportagem na Folha sobre o endosso de Dilma mostra que deve-se monitorar o nosso misery index para acertar as novas apostas sobre a política monetária. KB

Anônimo disse...

O que este governo faz que não tenha viés político?
Qual a única bandeira que a oposição possui?
A capacidade de controle da inflação.

Pode ter certeza, o governo não vai dar esta bandeira em 2014.

O custo deste combate pode até ser significativo (aumento do desemprego), mas terá muito menos peso político.

Agora, a ortodoxia é a única bandeira da oposição. E ela foi, mais uma vez, capturada pelo PT.
O FHC já até pediu para eles beijarem a cruz. Mas, ninguém vai dar bola para isso.

Digno de aplausos a sagacidade política do PT. Pragmatismo, diriam uns. Populismo, diriam outros. Sabedoria política diria eu. Pelo menos eles entendem de eleições.

Futuro: em setembro de 2014 a inflação estará na meta. Só uma hecatombe muda isso.

Anônimo disse...

Foi o Aécio que subiu os juros então?
Maradona

Drunkeynesian disse...

Anon, esses quotes são do Barbosa?

Outro anon, esse IOF vai ser cortado em breve, justo quando ninguém vai querer ficar vendido.

Terceiro anon, vou ler essa reportagem, seria um jeito meio maluco de fazer política monetária, mas não estamos exatamente em uma era de sanidade nessa área.

Curioso achar que há alguma ação de política econômica que não é política, como se existisse claramente o certo e o errado na área...

Anônimo disse...

"como se existisse claramente o certo e o errado na área..."
Não existe o certo mesmo. Mas certamente existe o errado.
Maradona

Anônimo disse...

"A combinação de câmbio mais depreciado e juros mais altos soa como um ajuste ortodoxo necessário, mas que, num cálculo político (no qual eu acreditava), seria empurrado para depois das eleições presidenciais do ano que vem, já que arriscaria comprometer algumas bandeiras eleitorais importantes (consumo, juros na mínima histórica e inflação, considerando que a depreciação do câmbio tem efeito mais rápido do que a alta dos juros). "

minha hipótese é que o governo percebeu que segurar o ajuste até as eleicoes poderia ser custoso demais ou insustentável e resolver fazer ele logo, pra depois ter magem para entrar numa trajetória de afrouxamento perto das eleicoes. O povo olha mais pra tendência que pro nível.

Jorge Browne disse...

DK, achava como tu que essas medidas ficariam para 2015. Entretanto a ata do COPOM não deixa dúvidas do comprometimento com o controle da inflação:

33. O Copom avalia que, no curto prazo, a inflação em doze meses ainda apresenta tendência de elevação e que o balanço de riscos para o cenário prospectivo se apresenta desfavorável.

34. O Copom destaca que, em momentos como o atual, a política monetária deve se manter especialmente vigilante, de modo a minimizar riscos de que níveis elevados de inflação como o observado nos últimos doze meses persistam no horizonte relevante para a política monetária.


Essa história de frouxidão do BC para mim é conto que alguns passaram e a maioria acreditou.

@Maradona: o errado só pode existir se existir o certo :)

P.S.: DK, continua comentando que comigo agora são 4 pessoas pedidndo.

Drunkeynesian disse...

Pois é, quem apostou em BC frouxo está perdendo as calças... não vi essa mudança vindo, mas parece relevante.

Anônimo disse...

Caro Jorge, você não me aliviou mesmo! Filosofia não é o meu forte, pelo menos sóbrio! Mas esse dilema entre certo e errado tem lugar no mundo acadêmico, na vida real, negócios e relações pessoais existem erros inquestionáveis (ações). Brincando, mas quem usa essa argumentação de inexistir certo e errado até o limite, na vida prática, deve ter um rabo preso ou dá aula de filosofia.
Desde o segundo semestre de 2012 o BC vinha minando as esperanças de alguma ortodoxia, em out-12 ele caiu 25 bps e a inflação já tinha ido para o beleléu (onde está até hoje). Estava duro apostar na selic salvo a China voltasse a crescer 10% ou os juros americanos voltassem a subir forte. Mas mesmo assim eu achava muito possível, liberaram o BC, os juros ainda são a ferramenta mais fácil politicamente de ser acionada para se manter tudo como está. O Aécio ficou sem muito o que dizer agora! Fica muito claro que o BC está negociando em tempo real seus movimentos com o governo, mais que nunca na história. Mas também não vejo nada de mais grave nisso, dado que o governo teme eleitoralmente uma argentinização. Governo ruim e um bom sinal das pesquisas de opinião. Viva o marketeiro e cuidado com os conselheiros da Dilma! Fico mais tranquilo, pelo menos até 2015 chegar e as pesquisas de opinião perderem relevância.
Maradona

Anônimo disse...

Caríssimos economistas,
Então quando o BC sobre os juros é porque mostrou força? Na humilde impressão deste que vos escreve, na verdade o PC piscou. E agora o mercado vai partir pra curra. Enfim, nos dizeres do Delfim, o último peru de Natal na mesa voltou a se mostrar suculento como nunca.

Anônimo disse...

Acho que o 'modus operandis' deste governo mostra que ele eh capaz de fazer intervencoes na economia a forceps, apenas pra garantir as eleicoes!!

O problema eh que sao solucoes de curto prazo e sempre com vies ideologico! Pode ajuda-los nas eleicoes mas nos continuamos na mesma!

Desta forma, enquanto o resto do mundo se esforca por modernizar-se ficamos na companhia de Venezuela, Argentina, Cuba e outros paises cuja companhia em termos de economia nao eh desejavel!

Talvez tenhamos outra(s) decada(s) perdida(s), essas com matizes em vermelho!!

Roni