Ao longo desse trabalho, foram encontrados indícios significativos de que o Banco Central tende a intervir no mercado contra uma tendência em curso da taxa de câmbio. Se esse é o caso, e essa percepção esta suficientemente difundida entre os agentes privados, toda vez que o Banco Central atua, a convicção dos especuladores em uma determinada direção da taxa de câmbio será reforçada, dado que a intervenção oficial por parte de um órgão que possui informações privilegiadas acerca do mercado de câmbio estaria sinalizando mais claramente uma tendência que ele estaria tentando suavizar.
Esse "reforço de convicção" faz com que uma simples estratégia de acompanhar médias móveis tenha retornos significativamente positivos em períodos de atuação do BC. No caso recente, como a tendência clara é de valorização do real, a estratégia em questão faria com que especuladores atuassem na ponta contrária a do BC (BC comprando dólares, mercado vendendo), o que implica, enquanto a atuação da autoridade monetária não causa uma desvalorização abrupta da moeda, em uma transferência de dinheiro do setor público para os players do mercado financeiro (as flutuações do câmbio são mais do que compensadas, ao longo do tempo, pelo diferencial de juros entre aplicações em reais e aplicações em dólares). Em Português claro, o BC faz a vida dos especuladores mais fácil, suavizando os movimentos da taxa de câmbio, indicando a direção percebida do mercado e arcando com o custo das reservas / swaps reversos. Para os professores, entretanto:
Provavelmente em seu entender, esse custo é mais do que justificado pelos benefícios trazidos por um gerenciamento cauteloso do regime cambial e das reservas. A julgar pelos resultados obtidos até aqui em termos de indicadores macroeconômicos, a estratégia parece estar funcionando.
Está? Ficou para um próximo estudo provar que o tal gerenciamento cauteloso do regime cambial explica a melhora de indicadores macroeconômicos (isoladas outras variáveis). Outro aspecto que o trabalho não menciona é que a tal previsibilidade do BC tem um efeito colateral importante: o ciclo descrito acima faz com que as posições de carry tornem-se mais atrativas, com o Brasil oferecendo uma combinação quase única de certa estabilidade macroeconômica, juros altos e um banco central que atua de forma regrada. Essa atratividade traz mais recursos em moeda estrangeira para o país, o que aumenta a necessidade e o custo das intervenções no mercado.
Num país onde se tem pouco respeito pelo dinheiro do contribuinte, as críticas para esse tipo de atuação são quase inexistentes: há um certo consenso que previsibilidade é um valor conquistado, e que a trajetória da moeda não deve ser alterada artificialmente. Paradoxalmente, da forma como opera, o BC atrai recursos para o país que podem gerar uma valorização no câmbio que também pode ser chamada de "artificial" (provavelmente parte do fluxo especulativo não apareceria caso o comportamento do câmbio não fosse tão previsível). Não à toa, novamente, temos visto intervenções agressivas do BC no mercado não gerando nenhum efeito significativo na taxa de câmbio. Parece que o Banco Central joga para a platéia, atendendo a uma demanda da Fazenda e de outros setores do governo e lavando as mãos dizendo: "eu fiz o possível, seria pior se não tivesse atuado".
Falta os formuladores de políticas do Brasil perceberem que a era de "fundamentalismo de mercado" está acabando, e que não necessariamente o que é bom para o mercado financeiro é igualmente bom para o país. Na ausência de uma política econômica clara (não acho que haja um consenso em Brasília sobre, a essa altura, se é preferível ter um câmbio valorizado ou desvalorizado), temos pagado caro por uma tranquilidade aparente que, num primeiro grau, só beneficia o mercado financeiro. Não tenho absolutamente nada contra especuladores per se (até porque, de alguma forma, meu trabalho se encaixa nessa categoria). Especuladores são animais adaptáveis, que operam em função de um determinado ambiente. Atualmente o Brasil cria, às custas do contribuinte, um ambiente quase ideal para ganhos especulativos, com efeitos não claramente benignos para o a economia. É hora do governo tomar posição no debate, para pelo menos sabermos qual causa está sendo beneficiada com esses gastos.
2 comentários:
E sempre foi assim...Em meados de 1995, quando o Gustavo Franco introduziu a "mini banda ascendente", na qual o real se desvalorizaria algo como 0,4% por semana? E a taxa de juros era de 4,2% ao mês? Pois bem, na época trabalhava nos EUA, num grande hedge fund (dentro de uma empresa). Recomendação: Entra no Brasil no limite (unhedged) e lucra algo como 2,6% ao mês. Tiveram um pouco de medo, mas fizeram alguma coisa, ganhando USD2mm no mês!
Muito bem lembrado... os BCs ainda enxergam o mercado como "parceiro". No México tinha uma história desse tipo, o cara leiloava uma quantia fixa de dólares por dia. Passado o leilão, o mercado inteiro ia pra cima.
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