quarta-feira, 9 de junho de 2010

Mentiras, estatísticas e imprensa - o PIB do primeiro trimestre

Manchete principal da Folha de hoje:

PIB tem maior alta de 1996

O Produto Interno Bruto, soma dos bens e riquezas que o país produz, subiu 9% de janeiro a março ante igual período de 2009. É a maior alta desde janeiro de 1996, quando o IBGE iniciou esse tipo de comparação. Mantido esse ritmo, o crescimento superaria 11% neste ano. Os destaques da alta nos três primeiros meses foram a indústria e os investimentos.

Primeiro, a extrapolação é ridícula -- o ritmo nunca é mantido, existem fatores sazonais e a economia muda (dã) durante o ano. Segundo, qual é o mérito de ter "a maior alta de 1996"? Não vou me dar ao trabalho de olhar os dados deste caso, mas vamos a um exercício teórico: imaginemos que o PIB de um país qualquer (Elbonia) foi 100 no primeiro ano. No segundo ano, uma recessão varre o país e o PIB cai 40% (para 60). No terceiro ano, acontece uma recuperação, o PIB cresce espetaculares 60% (a Gazeta da Elbonia estampa na capa: "maior alta da história") e... vai para 96, ainda abaixo do nível que estava antes da recessão. Qual é a vantagem? Os idiotas e/ou mal intencionados chamam de "pibão" (ver aqui), manchetes desse tipo aparecem nos jornais e o engodo está estabelecido (para não mencionar que estamos em ano eleitoral).

Em 2008, o Brasil cresceu 5,14%. No ano passado, o PIB caiu 0,2%. Este ano, pelas previsões otimistas do mercado, deve crescer algo como 7,5%. Na composição dos três anos, a média de crescimento anual é pouco mais de 4%. Não é horroroso (ainda mais considerando o tamanho da crise pela qual o mundo passou no período), mas também não tem nada de espetacular (para não usar o ridículo adjetivo "chinês", que virou moda). É explicável (mas não justificável) políticos quererem massagear números para fazê-los melhores; a imprensa tem a obrigação de tratar os leitores como adultos e mostrar as coisas como elas são, ao invés de propagar mentiras disfarçadas como estatísticas.

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