quinta-feira, 6 de maio de 2010

Número do dia: 537779%

Foi a valorização do quadro Desnudo, Hojas Verdes y Busto, de Pablo Picasso, desde 1951 (vendida por US$ 19,8 mil) até ontem, quando foi leiloado por US$ 106,5 milhões (novo recorde para uma obra de arte) na Christie's de Nova York . A inflação americana no mesmo período foi cerca de 745%.

Mais no Estadão.


"A nickel ain't worth a dime anymore." - Yogi Berra.

O maior dedo gordo da história?

Quem estava sentado em uma mesa de operações há alguns minutos tomou um susto gigantesco, e pode ter presenciado o maior caso de dedo gordo (fat finger) da história do mercado financeiro. Todos os grandes mercados (juros, ações, commodities) tivera movimentos violentíssimos em segundos (em um dia que não estava exatamente tranquilo) -- o índice de ações americano caiu 5% em um movimento contínuo.
Enquanto não há uma explicação "oficial", dois boatos circulam: um que um banco americano queria vender US$ 16 milhões em futuros de ações e, por um erro de digitação, acabou vendendo US$ 16 bilhões. O outro é um erro similar nas ações da Procter & Gamble, que caíram 36% (!!!) de uma vez:

Caso pior foi nas ações da consultoria Accenture, que estavam operando a US$ 41 e chegaram a ser vendidas por UM centavo (queda de 99,98% -- ou de mais de 100%, como diria o Luiz Nassif). A empresa morreu e foi ressuscitada em segundos:



Erros operacionais à parte, o episódio é uma ilustração aterradora do nível de integração e consequente fragilidade (Taleb... sempre ele) do mercado financeiro atualmente: o erro em uma ação fez com que computadores entendessem que àquele nível deveriam vender um índice, comprar ouro, vender euro, comprar títulos do tesouro.... as consequências poderiam ter sido devastadoras.
Update: tem algo na CNBC sobre o assunto.

Infraestrutura no Brasil

Para os interessados, uma overdose sobre o tema, via Financial Times e Morgan Stanley.

Especuladores, esses incompreendidos


Basta aparecer uma crise para que dedos comecem a apontar para os especuladores. Os corvos. As hienas. Os aproveitadores inescrupulosos. São os alvos preferidos de políticos, como forma de desviar a atenção de sua própria incompetência e dos exageros das sociedades que comandam (ver a declaração da dona Merkel hoje). Jornalistas, que, no geral, gostam de explicações fáceis, também costumam apelar para essa prática. É de fazer perder (mais) a fé na classe ler o editorial de Clóvis Rossi na Folha de hoje. Um dos mais experientes e visíveis profissionais da imprensa no Brasil usa até uma defesa dos "bancos não corsários" para ilustrar a sua análise rasa e mal informada.
Ele diz que não há "rationale" (que belo termo... soa sofisticado, não?) para o que está ocorrendo na Europa -- como se anos de desequilíbrio e falta de austeridade não justificassem uma piora no custo da dívida dos governos. Os "bancos não corsários", coitados, são os mesmos que receberam ajuda dos tesouros nacionais para não quebrarem por suas más decisões de crédito, e agora estão sem saber o que fazer com as carteiras repletas de títulos de países, companhias e hipotecas com baixa capacidade de pagamento. Exemplo mais gritante: títulos da dívida da Grécia foram adquiridos para se obter um excesso de retorno de 0,65% ao ano (a diferença média, na última década, do rendimento de um título de dez anos da Grécia para um equivalente da Alemanha -- ver o gráfico -- hoje essa diferença é de 8,18% ao ano). Falemos sobre "ganância desenfreada".

É difícil gostar de um especulador. Sua tarefa parece fácil e desproporcionalmente recompensada -- talvez a última impressão seja verdadeira, mas, definitivamente, não é fácil lucrar tentando antecipar movimentos do mercado (sem informação privilegiada, claro). Para começar, recomendo fortemente a leitura do (especulador) Hugh Hendry, numa coluna para o Telegraph de dois meses atrás. Especuladores podem não ser totalmente admiráveis (no Brasil, não ajuda a palavra ser praticamente sinônimo de "Naji Nahas"), mas são uma parte importantíssima e necessária do mercado -- merecem, ao menos, serem tratados sem os preconceitos e maniqueísmos costumeiros.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

O que é, o que é...

Do último Investment Outlook de Bill Gross, da PIMCO (que, apropriadamente, chuta as agências de classificação de risco):

"Here’s a country with 20% unemployment, a recent current account deficit of 10%, that has defaulted 13 times in the past two centuries, whose bonds are already trading at Baa levels, and whose fate is increasingly dependent on the kindness of the EU and IMF to bail them out. Some AAA!"

terça-feira, 4 de maio de 2010

Vídeo do dia - Esther Duflo

Assistir à apresentação da ganhadora da medalha John Bates Clark deste ano sobre experimentos sociais para combater a pobreza me faz ter um pouco de fé em parte da academia.


Mercado imobiliário brasileiro: bolha à vista?

O beyondbrics comentou ontem um artigo do G1 do último dia 15, considerando a possibilidade de formação de uma bolha no mercado imobiliário brasileiro, que vive dias de euforia. Minha primeira reação foi pensar que é difícil imaginar uma bolha se formando em um mercado onde a taxa de juros passa fácil dos dois dígitos. Depois, lembrei de um estudo do Edward Chancellor sobre a China que coloquei aqui, e decidir aplicar ao caso brasileiro o checklist que ele sugere para identificar uma grande bolha se formando (aqui a análise é mais específica para o mercado imobiliário brasileiro, o estudo original se aplicava a um país inteiro):

1 - Começo em uma história de crescimento plausível

Esse é moleza. Quantas vezes, nos últimos meses, não se ouviu falar que o Brasil estava, finalmente, emergindo? No caso específico do mercado imobiliário, virou moda falar em "déficit habitacional", e as empresas de construção civil, praticamente inexistentes na bolsa há cinco ou dez anos, viraram estrelas, e a atividade de emenei no setor explodiu.

2 - Fé cega na competência das autoridades

Políticos brasileiros saíram da crise de 2008 / 2009 como semideuses. Guido Mantega dá conselhos no FMI e para o secretário do tesouro americano, Henrique Meirelles virou o melhor banqueiro central do mundo e Lula... melhor nem comentar.

3 - Crescimento dos investimentos

O Brasil, em termos de proporção do PIB, ainda é um país que investe pouco (cerca de 20%). Porém, no setor imobiliário, o boom é notável, com novas construções pipocando por todo o país. Dados consolidados do setor são escassos, mas, novamente, o crescimento das construtoras é um indicador confiável para este critério.

4 - Aumento de corrupção

No Brasil? Para aprovar obras que devem sair o mais rápido possível, para aproveitar um mercado pegando fogo? Novamente, não há dados... mas é perfeitamente plausível.

5 - Crescimento da oferta de moeda

Para a conceituação das diversas medidas de oferta de moeda no Brasil, veja a nota do Banco Central. Grosso modo, M1 é a medida mais restrita de oferta de moeda (papel moeda em poder do público + depósitos à vista), e M3 é a mais ampla (inclui depósitos a prazo, cotas de fundos, etc...). Pelos últimos dados do Banco Central, M1 cresce a 18,6% na comparação ano contra ano (só deixou de crescer, desde 2003, em dezembro de 2008); M2 a 9%; M3 a 15% -- todos os crescimentos maiores que o do PIB nominal, como um bom monetarista pregaria. Há alguns dias o Banco Central iniciou um aperto monetário que deve implicar em um arrefecimento desses ritmos de crescimento, mas o saldo dos últimos anos é fortemente expansivo.

6 - Regime de câmbio fixo

Desse mal nos livramos em 1999. Trocamos a volatilidade do mercado por ajustes mais ágeis e um menor acúmulo de desequilíbrios ao longo do tempo. Um regime com o câmbio fixo supervalorizado é receita para acúmulo de empréstimos em moeda estrangeira a taxas atrativas, que viram impagáveis quando há a necessidade de uma desvalorização cambial -- ver Argentina em 2001.

7 - Crescimento do estoque de crédito

O volume total de crédito ao consumidor no país praticamente dobrou desde 2006. O estoque de crédito imobiliário, no mesmo período, foi multiplicado por quatro (partindo de uma base pífia, devemos reconhecer, e chegando num nível ainda muito baixo por comparação com qualquer outro país de nível de renda similar).

8 - Presença de risco moral

Se o conceito não existisse, teria que ser inventado para explicar algumas situações no Brasil. Para ser honesto, o tema é mundial, na medida em que os governos parecem dispostos a não deixar ninguém sofrer com más decisões de investimento.

9 - Estrutura financeira precária (projetos não geram caixa para pagar os empréstimos com os quais foram financiados)

Ainda é difícil avaliar. Por enquanto as companhias parecem estar bem, obrigado. Mas, num ambiente de juros subindo, o fim da euforia pode jogar vários projetos nessa categoria.

10 - Aumento no preço de imóveis

É do que estamos falando. Altas percentuais de dois dígitos são sintomáticas e tendem a não se sustentar no tempo.


8 / 10. Dá para acender uma luz amarela, não? A "compensação" é que há tantas outras bolhas mais gritantes do mundo que, provavelmente, o estouro delas vai ajudar a normalizar as coisas no Brasil antes que elas implodam por força própria.

A rede da dívida européia

Via New York Times (clique para aumentar):



Não lembra a cena clássica do Cães de Aluguel?

Pré-sal - uma rápida checagem de estimativas

A Folha destacou há pouco a publicação de um estudo da FGV que estima em US$ 14 o custo de extração por barril de petróleo na região do pré-sal. Uma rápida pesquisa no Google trouxe um estudo da Agência Internacional de Energia onde a mesma estimativa (extração em águas profundas e ultraprofundas) é algo entre US$ 32 e US$ 65. Em quem confiar? Qual é a margem de segurança da Petrobras? Deixo essas perguntas para os especialistas.

Que pena, Zapatero

"Never believe anything until it has been officially denied."
Claud Cockburn

Da Reuters, via Financial Times:

RTRS-SPANISH PM ZAPATERO SAYS RUMOUR OF SPAIN ASKING FOR 280 BLN AID FROM EURO ZONE IS COMPLETE MADNESS

RTRS-SPANISH PM ZAPATERO SAYS SPAIN HAS STRONG SOLVENCY ON DEBT

RTRS-SPANISH PM ZAPATERO SAYS RUMOURS CAN DAMAGE SPAIN’S INTERESTS, THAT’S INTOLERABLE

RTRS-SPANISH PM ZAPATERO SAYS LOAN FOR GREECE IS A CONSIDERABLE COMMITMENT FROM SPAIN

RTRS-SPANISH PM ZAPATERO SAYS SPAIN HAS TO RESTRUCTURE FINANCIAL SECTOR

A bolsa e o Coelho Branco

Assim como o Coelho Branco de Alice no País das Maravilhas, as pessoas físicas estão sempre atrasadas -- pelo menos nos movimentos do mercado de ações. A Exame levantou que, durante abril, os investidores individuais foram a contraparte do fluxo vendedor de investidores estrangeiros e institucionais. Mais uma vez o varejo parece ter reagido atrasado a uma alta de preços, e entrou no mercado quando os investidores mais informados estão vendendo. Por enquanto o movimento dos preços tem seguido a cartilha -- a bolsa brasileira teve uma performance bastante ruim em abril, e começou maio também em queda.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

A Apple faz de novo

A Apple anunciou hoje que atingiu a marca de um milhão de unidades vendidas do seu iPad. Para isso foram necessários 28 dias, menos da metade que o fenômeno iPhone levou para atingir o mesmo número (74 dias). A tática da Apple de criar produtos inovadores e esperar que a demanda por eles apareça segue intacta, para sorte do acionista -- a ação da Apple segue perto das máximas históricas (valor de mercado de US$ 240 bilhões -- quase um quarto de todas as companhias listadas na Bovespa), mesmo com um cenário não exatamente auspicioso para companhias mundo afora.

Você percebe que a Europa está com problemas...

... quando é aprovado um pacote de ajuda de quase US$ 150 bilhões para a Grécia (o suficiente para fazer com que o país não precise acessar o mercado pelo menos nos próximos dois anos -- para maiores detalhes, ver o bom trabalho do Morgan Stanley abaixo) e, no dia seguinte, as bolsas caem e o euro se desvaloriza (enquanto escrevo, opera quase 0,83% abaixo do fechamento de sexta-feira, a EUR 1,3183 / US$).

O ceticismo do mercado me parece justificado. Os contribuintes simplesmente não estão dispostos a fazer os sacrifícios voluntariamente. Destaco, como anedota, uma matéria muito interessante do New York Times neste sábado, mostrando como os gregos mentem em suas declarações de impostos (o artigo começa citando que apenas 324 residentes de um subúrbio rico ao norte de Atenas declararam que possuem piscina em casa, quando uma contagem por imagens de satélite registrou quase 17 mil piscinas na região).

Boa parte dos europeus precisa se convencer que o enriquecimento dos últimos anos foi uma ilusão, baseado em uma apreciação grande do câmbio real e uma ajuda generosa dos países realmente ricos. O problema é que retirar privilégios adquiridos, legítimos ou não, deve gerar reações violentas (já estamos vendo algo nas ruas de Atenas), e políticos lidando com adversidades geralmente preferem soluções simplistas e desastrosas. Não pague para ver.

Greece Rescue Package - Morgan Stanley