Antônio Ermírio de Moraes é, sem dúvida, um dos maiores capitalistas do Brasil. Seu império (o grupo Votorantim) engloba empresas de cimento, celulose, metais, logística, e mais alguns setores. A figura de Antônio Ermírio, com seus ternos velhos e mal-cortados é um símbolo do "Brasil que dá certo", do empresário que sempre confiou no país e foi recompensado por isso com uma fortuna de alguns bilhões de reais.
Hoje, em sua coluna semanal na Folha de São Paulo, Antônio Ermírio comenta o texto que comentei no texto abaixo. O título da coluna é "A festa dos especuladores", de onde se pode facilmente inferir o conteúdo. Alguns trechos: "Com inflação ou sem inflação, eles (os especuladores) sempre fazem rodar a seu favor a nefasta ciranda financeira."; "Os brasileiros precisam de empregos, atenção às crianças, saúde bem cuidada e segurança individual. De que forma os especuladores colaboram para esses objetivos?".
Eu já critiquei os argumentos do texto original, e fico decepcionado ao ver um grande empresário embarcando nesse tipo de discurso retrógrado. Interessante também é constatar que Antônio Ermírio de Moraes pode ser demagogo, mas não é burro: o grupo Votorantim também atua no mercado financeiro, por meio de um agressivo banco de investimentos, uma gestora de recursos e uma financeira (posso estar esquecendo mais algum negócio), em busca dos lucros advindos da "ciranda financeira" brasileira. Creio já ter ouvido falar que Moraes teria vergonha dessas companhias, mas até onde se sabe elas seguem lucrativas e sem planos de serem vendidas ou desativadas.
Na prática, os estrangeiros vão continuar aplicando em títulos do Brasil enquanto os juros que pagamos pela nossa dívida pública continuem, ajustados pelo risco, brutalmente maiores do que os de outros países. As razões por trás deste fenômeno preencheriam vários livros, mas creio que resta pouca dúvida de que essas razões incluem o nosso estado glutão e ineficiente. Diminuindo o déficit nominal (a diferença entre o que o governo arrecada e gasta, incluindo o serviço da dívida), teríamos menor oferta de títulos para uma determinada demanda, forçando juros menores. Se a meta de inflação tivesse sido reduzida para 4% neste ano, em teoria teríamos juros de equilíbrio 0,5% menores (afinal, juros futuros podem ser decompostos, grosso modo, em juros reais + expectativa de inflação + prêmio de risco). Enfim, o que não se vê é que os juros altos e a "ciranda financeira" são um efeito colateral do modelo econômico que o Brasil resolveu seguir. O resto é conversa mole.
domingo, 28 de outubro de 2007
segunda-feira, 22 de outubro de 2007
Desserviço ao Brasil
Eu sou leitor da Folha de São Paulo desde que me entendo por gente (talvez até antes disso). E, como sabemos, uma vez que algo vira hábito, é difícil livrar-se dele. Mas, além do hábito, ainda acho que a Folha é um bom jornal, com bons colunistas, matérias pertinentes e alguns bons editoriais. O que, às vezes, me dá vontade de parar de ler a Folha são as suas visões do século retrasado. Hoje, por exemplo, a manchete principal (da capa, não só do caderno de economia) diz que "Estrangeiro lucra o dobro com dívida do governo". Dois fatores explicam esse "fenômeno": a valorização do real e a isenção de imposto de renda para os investidores não-residentes. Isso não deveria ser novidade para ninguém que acompanha minimamente o mercado financeiro: quando o estrangeiro compra um título brasileiro, além dos riscos de crédito e de juros, ele toma também um risco de moeda, que pode ou não ser neutralizado com uma outra operação (hedge). Como o hedge tem um custo não desprezível, e a tendência da moeda tem sido de valorização, a maioria dos investidores opta por carregar esse risco. Da mesma forma, se o real se desvalorizasse, os investidores teriam parte dos seus ganhos corroídos - e duvido que a Folha noticiaria algo do tipo "Estrangeiro lucra a metade com dívida do governo".
Já a isenção do IR faz parte da política de administração da dívida. Vários estudos (posso indicar um da ANDIMA, disponível aqui) mostram que, no caso de países como o Brasil, a abertura do mercado de dívida pública para estrangeiros ajuda a melhorar o perfil da dívida, tanto em sua composição (a divisão entre títulos pós-fixados, pré-fixados e indexados à inflação) quanto em sua duração (estrangeiros tendem a preferir títulos mais longos). A isenção do IR, nesse contexto, é um incentivo para a entrada de capital estrangeiro, o que facilita o gerenciamento da dívida e acelera a convergência para uma estrutura ótima para os passivos do país (traduzindo, outros estudos indicam uma composição ótima da dívida - onde a evolução dos passivos do país, a dívida, é compatível com a evolução dos seus ativos, basicamente a arrecadação de impostos).
Ao dar destaque para o que não deveria ser notícia, a Folha contraria a sua premissa ("Um jornal a serviço do Brasil", é o que se lê no topo da primeira página de cada edição) e alimenta as visões mais toscas de repúdio ao capitalismo global - as do tipo "capital estrangeiro prejudica o país, estrangeiros tem lucro fácil". Infelizmente, em certa medida, parece ser esse tipo de visão que predomina na edição do maior jornal do Brasil. Tanto pior para o país.
Já a isenção do IR faz parte da política de administração da dívida. Vários estudos (posso indicar um da ANDIMA, disponível aqui) mostram que, no caso de países como o Brasil, a abertura do mercado de dívida pública para estrangeiros ajuda a melhorar o perfil da dívida, tanto em sua composição (a divisão entre títulos pós-fixados, pré-fixados e indexados à inflação) quanto em sua duração (estrangeiros tendem a preferir títulos mais longos). A isenção do IR, nesse contexto, é um incentivo para a entrada de capital estrangeiro, o que facilita o gerenciamento da dívida e acelera a convergência para uma estrutura ótima para os passivos do país (traduzindo, outros estudos indicam uma composição ótima da dívida - onde a evolução dos passivos do país, a dívida, é compatível com a evolução dos seus ativos, basicamente a arrecadação de impostos).
Ao dar destaque para o que não deveria ser notícia, a Folha contraria a sua premissa ("Um jornal a serviço do Brasil", é o que se lê no topo da primeira página de cada edição) e alimenta as visões mais toscas de repúdio ao capitalismo global - as do tipo "capital estrangeiro prejudica o país, estrangeiros tem lucro fácil". Infelizmente, em certa medida, parece ser esse tipo de visão que predomina na edição do maior jornal do Brasil. Tanto pior para o país.
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domingo, 21 de outubro de 2007
Kippis, Kimi!
quinta-feira, 18 de outubro de 2007
Quem tem medo do lobo mau?
Estou há um tempo para escrever um texto maior sobre isso (tentarei fazê-lo no final de semana), mas, como aperitivo, devo dizer que o governo está matando cachorro a grito para não perder a receita-molezinha da CPMF. Ontem, o presidente em exercício (enquanto Lula flana pela África) disse: "É claro que todas as pessoas são contra essa CPMF, mas todos compreendem que é preciso que se cuide do Orçamento da União para evitar qualquer problema ligado a retorno da inflação. Porque desequilíbrio orçamentário significa abrir espaço para a inflação voltar. E nós não queremos isso".
Para ficar no monetarismo mais rasteiro, de estudante de economia de primeiro semestre, inflação é sinônimo de moeda em excesso. Ou seja, um problema orçamentário só se traduz em inflação se o governo optar por resolvê-lo do jeito mais primitivo possível: imprimindo dinheiro. O Brasil cansou de fazer isso, há alguns anos. Ouvir de um membro da alta cúpula do governo que existe a possibilidade de isso voltar a ocorrer, por mais que eu saiba que seja uma ameaça vazia e grosseira, me dá vontade de bater a cabeça na quina da mesa.
Para quem assina a Folha: Inflação vai voltar sem o tributo, diz Alencar
Para ficar no monetarismo mais rasteiro, de estudante de economia de primeiro semestre, inflação é sinônimo de moeda em excesso. Ou seja, um problema orçamentário só se traduz em inflação se o governo optar por resolvê-lo do jeito mais primitivo possível: imprimindo dinheiro. O Brasil cansou de fazer isso, há alguns anos. Ouvir de um membro da alta cúpula do governo que existe a possibilidade de isso voltar a ocorrer, por mais que eu saiba que seja uma ameaça vazia e grosseira, me dá vontade de bater a cabeça na quina da mesa.
Para quem assina a Folha: Inflação vai voltar sem o tributo, diz Alencar
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segunda-feira, 15 de outubro de 2007
Chuck Norris aplicado ao mercado financeiro
Acredito que quase a totalidade dos que estavam ligados na internet nos últimos meses testemunhou a ressurreição gloriosa de Chuck Norris por meio dos hilários "Chuck Norris Facts". Pois bem: demorou, mas Chuck Norris chegou ao mercado financeiro. Enquanto estava de férias, recebi um e-mail com a aplicação do homem que já contou até infinito duas vezes para o dia-a-dia dos neuróticos que acompanham o vai e vem da economia e dos mercados mundiais. Piada nerd, da qual a maioria da população não vai achar a menor graça, mas eu achei excelente, e o blog é para isso, mesmo. Enfim, aí vão os "Chuck Norris Facts" para o mercado financeiro - tradução livre minha:
Via Mark Gilbert, da Bloomberg.
- Chuck Norris não persegue metas para a inflação. Ele as chuta até que implorem piedade.
- O dólar de Chuck Norris compra 3 dólares canadenses e opera em paridade com o euro.
- As lágrimas de Chuck Norris proveriam liquidez suficiente para resolver a crise de crédito. Pena que ele nunca chora.
- Quando a taxa de um título de renda fixa do Chuck Norris sobe, o preço também sobe. (esta é MUITO nerd).
- Chuck Norris opera em ganância e medo simultaneamente.
- Alan Greenspan chama Chuck Norris de "O Maestro".
- Chuck Norris já recebeu o seu pagamento de dividendos da Northern Rock Plc.
- Chuck Norris se financia a LIBOR careca.
- Chuck Norris Asset Management ganhou 50% no seu fundo de títulos lastreados em hipotecas subprime no último mês.
- Chuck Norris não toma emprestado na janela de redesconto do Fed. Chuck Norris empresta na janela de redesconto.
- As curvas de juros de Chuck Norris nunca se invertem.
- A receita líquida do Goldman Sachs subiu 79% no terceiro trimestre; o lucro da Chuck Norris Securities subiu 80%.
- Não há um regulador de mercados. Apenas uma lista de ativos que Chuck Norris permite que sejam negociados.
- O iPhone de Chuck Norris nunca precisa ser recarregado.
- Chuck Norris não compra ouro para se proteger contra inflação. O ouro compra Chuck Norris para se proteger contra inflação.
- Chuck Norris cobra uma taxa de penalidade para empréstimos ao Banco da Inglaterra. E garante seus depósitos.
- Chuck Norris é o piloto que Ben Bernanke chama quando quer inundar a economia com notas de dólar. Às vezes, Chuck Norris recusa-se a voar.
- Chuck Norris não faz marcação a mercado. O mercado se marca a Chuck Norris.
- Quando a economia americana espirra, o mundo pega um resfriado. Quando Chuck Norris espirra, a economia americana pega pneumonia.
- Quando Chuck Norris te oferece um preço, não é uma oferta; é uma obrigação para comprar.
- Chuck Norris não é um "market maker"; ele É o mercado.
- Chuck Norris ainda consegue uma hipoteca de 125% de uma casa de 2 milhões de dólares sem comprovar renda.
- Os títulos lastreados em hipotecas subprime de Chuck Norris ainda operam a 100% do valor de face.
- Chuck Norris tem um superávit comercial com a China.
Via Mark Gilbert, da Bloomberg.
A triste volta ao trabalho e o aniversário da Segunda-Feira Negra
Depois de quase três semanas de vida mansa, a volta ao trabalho é sempre dura. Principalmente vindo direto para um emprego novo, mudando de um banco gigantesco para uma empresa pequena e recém-nascida. Uma das minhas citações favoritas de Keynes, que está na introdução da famosíssima "Teoria Geral" é: "The difficulty lies, not in the new ideas, but in escaping from the old ones, which ramify, for those brought up as most of us have been, into every corner of our minds." (algo como "A dificuldade está não em criar novas idéias, mas em escapar das antigas."). Espero que, como o próprio patrono deste humilde blog, eu consiga superar esse obstáculo em breve.
Tenho vários assuntos para dar palpites. Para começar, esta semana (dia 19) teremos aniversário de 20 anos da famosa Segunda-Feira Negra, o fatídico dia em que a bolsa americana (medida pelo índice Dow Jones) teve a maior queda da história, vertiginosos 22,6% em um único pregão. Essa foi a prova de fogo para Alan Greenspan, que tinha assumido o Fed pouco mais de um mês antes. Como toda boa crise financeira, a Segunda-Feira Negra ainda não tem uma explicação definitiva, mas entrou para a história como mais uma prova de que mercados financeiros podem, às vezes, esconder qualquer indício de racionalidade e agir puramente em função do pânico.
A mídia deve, nos próximos dias, fazer um festival de cobertura por conta dessa data; por enquanto, fique com a compilação feita pelo The Big Picture (infelizmente, só em inglês; quando eu achar algo interessante em português, colocarei aqui).
Vou tentar atualizar os demais assuntos nos próximos dias. Fiquem ligados!
Tenho vários assuntos para dar palpites. Para começar, esta semana (dia 19) teremos aniversário de 20 anos da famosa Segunda-Feira Negra, o fatídico dia em que a bolsa americana (medida pelo índice Dow Jones) teve a maior queda da história, vertiginosos 22,6% em um único pregão. Essa foi a prova de fogo para Alan Greenspan, que tinha assumido o Fed pouco mais de um mês antes. Como toda boa crise financeira, a Segunda-Feira Negra ainda não tem uma explicação definitiva, mas entrou para a história como mais uma prova de que mercados financeiros podem, às vezes, esconder qualquer indício de racionalidade e agir puramente em função do pânico.
A mídia deve, nos próximos dias, fazer um festival de cobertura por conta dessa data; por enquanto, fique com a compilação feita pelo The Big Picture (infelizmente, só em inglês; quando eu achar algo interessante em português, colocarei aqui).
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