sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

Os livros de 2018

Este blog está convergindo para uma publicação anual, justamente esta. Aqui o que li de interessante em 2018, em nenhuma ordem particular (a amostra toda está no Goodreads).

Ficção:

'Dias de Abandono', Elena Ferrante. Recomendo muitíssimo ler seguido de 'Laços', do Starnone, o suposto marido da grande dama. Este artigo explora a conexão.

'Pachinko', Min Jin Lee. Novelaça que segue três gerações de uma família coreana que fugiu para o Japão. Talvez o livro que mais gostei de ter lido este ano.

'Nocturnes: Five Stories of Music and Nightfall', Kazuo Ishiguro. Cinco contos que têm música como tema de fundo, bons pra aquecer o coração.

'It Can't Happen Here', Sinclair Lewis. Livraço de história alternativa, escrito no calor da ascendência do nazifascismo.

'Pssica', Edyr Augusto. Policial amazônico em ritmo alucinante, pra ler em uma sentada e ficar pensando numa adaptação porreta pra cinema.

'Total Chaos', Jean-Claude Izzo. Grande hino de amor a Marselha em forma de romance policial.

'Ruins', Peter Kuper. HQ lindíssima, vai fazer você querer marcar as próximas férias para conhecer Oaxaca.

'4 3 2 1', Paul Auster. Leitura muito mais rápida e prazerosa que o tamanho sugere.

'Feast Days', Ian MacKenzie. Uma história de expatriados em São Paulo durante os dias estranhos de 2013-14.
"A gauze of pale light stretched around buildings after the rain. It was a city of liquor bottles, soccer matches, cheap motorcycles, boys in the road, businessmen. Sometimes it was beautiful."
'Trick', Domenico Starnone. Um degrau abaixo de 'Laços', mas ainda grande.

'Órfãos do Eldorado', Milton Hatoum. Outra história amazônica pra ler em uma sentada.

Não-Ficção:

'Democracy for Realists: Why Elections Do Not Produce Responsive Government', Christopher H. Achen e Larry Bartels. As virtudes da democracia não incluem premiar bons governos, e o acaso (sempre ele) tem papel no resultado de eleições maior do que se costuma supor.

'Holidays in Hell', P.J. O'Rourke. Da época em que chamar um lugar de 'shithole' não causava uma crise diplomática.

'Microeconomics: a Very Short Introduction', Avinash K. Dixit. Dixit é um dos grandes didatas da ciência lúgubre.

'Other People's Trades', Primo Levi. Levi também foi um grande cronista, além de tudo mais.

'História da Riqueza no Brasil', Jorge Caldeira. Muito concentrado no pré-república, mas grande referência.

'Factfulness', Hans Rosling. O último legado do grande Rosling, que nos deixou em 2017. Deveria ser leitura obrigatória em qualquer curso de introdução ao desenvolvimento internacional.

'País Mal Educado: por que se aprende tão pouco nas escolas brasileiras?', Daniel Barros e 'São Paulo nas Alturas', Raul Juste Lores. Dois livros brasileiros não-técnicos de história/assuntos correntes à altura do que é feito de melhor fora daqui.

'Jorge Amado: Uma Biografia', Josélia Aguiar. Biografia à altura do enorme personagem.

'Playing Changes: Jazz for the New Century', Nate Chinen. O jazz está em uma das melhores fases da história, não é difícil se convencer.

Infantil:

'Islandborn', Junot Díaz e Leo Espinosa. História linda sobre identidade e imigração.



Um ótimo 2019 a todos e um muito obrigado para a turma do clube do livro mensal, com quem tive o grande prazer de compartilhar e discutir boa parte desssas leituras (não teria chegado a muitas delas sem as recomendações do grupo). Participar de um grupo de leitura é das coisas mais legais que descobri nos últimos tempos, recomendo muito.

quarta-feira, 25 de abril de 2018

Brazil 2018 General Elections – The Parties

This is the second post in the series. The first one is Brazil 2018 Presidential Elections – Potential Candidates.

Brazil has currently 35 registered parties, constituting what is probably the most shattered political system in the world. It has currently 14 effective parties in the Lower House (see Figure 1), and its three last congress elections (2006, 2010, and 2014) produced some of the most fragmented legislatures among 1,167 elections in 137 countries (see Figure 2).

Figure 1: Effective number of parties in Brazil's Lower House (source: Jairo Nicolau)
Figure 2: Effective number of parties in the Legislative (y-axis) and in the elections (x-axis) for 1,167 elections – last seven Brazilian elections are represented as triangles. Source: Nicolau (2017)
The table below tries to summarize the main characteristics of all currently registered parties in Brazil:



Power Index

How the sausage is made (source)

The Power Index is a quick and dirty measure I developed to evaluate the relative strength of the parties. I simply added, with equal weights, the share of each party in five arbitrary dimensions: membership (as of October 2017); mayors and mayors of state capitals (as elected in 2016); state governors, federal deputies, and senators (as elected in 2014). I normalized the sums so the highest value obtained is 100 and the others are simple proportions of it. Results are below.

Brazilian parties in the political spectrum

To avoid (much) controversy, I chose to label the parties preferentially as per their own reported ideological positions in a 2016 survey made by O Globo newspaper (results in Figure 3). For the parties that didn't answer it, I picked the modal position in a survey of other studies made in 2013 by Gabriel da Silva Tarouco and Rafael Machado Madeira (Figure 4). The latest round of the Brazilian Legislative Survey, coordinated by Timothy J. Power and César Zucco and partially released a few weeks ago by BBC Brazil, compiles those perceptions from interviews with lawmakers (Figure 5). I once wrote a PhD research proposal that included using machine learning to derive the average ideological position ("learned" from a sample of canonical publications from each "side") of a given party from the transcriptions of speeches delivered by their elected representatives. That would be cool, wouldn't it?

Figure 3: O Globo 2016 survey on parties' ideologies

Figure 4: Table from Tarouco & Oliveira (2013)
Figure 5: Results from the Brazilian Legislative Survey

Where do the parties come from?

This is a nice timeline, made by G1 in 2014 (click to enlarge):



References not linked above:

Nicolau, Jairo. Representantes de quem? Os (des)caminhos do seu voto da urna à Câmara dos Deputados. Rio de Janeiro: Zahar, 2017.

quarta-feira, 11 de abril de 2018

Brazil 2018 Presidential Elections – Potential Candidates

Desculpas aos leitores habituais em Português, mas vou usar este espaço para ir divulgando algumas partes de um projeto que desenvolvi em Inglês e acabou não virando. Espero que também aproveitem!

Brazil's 2018 general elections take place next October. During the lead-up to the voting day, I'll be posting information and analyses that may be useful for foreign investors or anyone interested in this major event. This is the first part: an extensive (but not exhaustive) list of the main potential presidential candidates – official candidacy registration starts only in July; so far we have many so-called self-declared "pre-candidates" and especulation about some names.

sexta-feira, 16 de março de 2018

Quando o acaso atropela talento e esforço

Do alto da minha arrogância de vestibulando de engenharia (17 anos, inteligentinho, estudando 8 horas por dia em um bom cursinho), eu ficava irritado quando, antes de alguma prova, alguém me desejava "boa sorte". Ora, na minha mente adolescente, todo o meu preparo e dedicação eliminavam qualquer papel do acaso, e o resultado do vestibular estava dado dias antes de eu sentar para fazer a prova, pela soma do tempo gasto na preparação. Sorte era pra quem não tinha estudado direito, obrigado.

Hoje, 20 anos depois, considero um indicador claro de amadurecimento perceber que quem estava certo memo era Nelson Rodrigues – que, além de aconselhar escrotinhos de 17 anos a envelhecer, dizia que "sem sorte não se chupa nem um Chicabon. Você pode engasgar com o palito ou ser atropelado pela carrocinha." Meritocracia só opera (quando opera) depois que uma série de possíveis azares, de difícil ou nenhum controle, são superados. Cada história de sucesso é um pequeno milagre probabilístico. Ou, como gosta de dizer um amigo, de forma mais eloquente e elegante, "o acaso é foda."

Em um livrinho que mistura histórias pessoais, estatística e propostas de reforma tributária, Robert H. Frank, professor de Cornell, propõe um experimento computacional relativamente simples (pode ser replicado no Excel, por exemplo): pegue 1.000 (ou 10.000, ou 100.000) pessoas, definidas por três atributos, distribuídos aleatoriamente pela amostra: habilidade, esforço e sorte. Cada atributo tem uma pontuação, de 0 a 100. Dê pesos iguais para habilidade e esforço, e atribua o restante – um peso relativamente pequeno, de 1% a 20% – à sorte. Use a composição desses atributos para definir o único vencedor de mil de torneios entre essas pessoas, e observe com qual frequência o resultado desvia da maior soma de habilidade e esforço – ou seja, quantas vezes o competidor mais habilidoso e esforçado deixa de vencer. Algum chute?


O produto de uma simulação está no gráfico acima. A direção dos resultados é intuitiva: quanto maior o peso da sorte, maior a probabilidade do vencedor não ser o que tem a melhor combinação de habilidade e esforço. E, dentro do mesmo nível de sorte, quanto maior a amostra, maior o peso da sorte – maior a probabilidade de um embate entre dois competidores com níveis equivalentes de habilidade + esforço ser decidida pela sorte. O que surpreende é quão frequente a parada é resolvida pelo acaso: em torneios com 100.000 participantes, em pelo menos 68% dos casos o vencedor não será o mais habilidoso/esforçado. Essa proporção sobe para mais de 90% quando a sorte determina apenas 10% do resultado na maior amostra testada. 

Mais recentemente, três pesquisadores italianos (dois físicos e um economista), partindo de uma ideia semelhante, propuseram um modelo ainda mais sofisticado e realista: para uma população de 1.000 pessoas dotadas de 10 unidades, distribuídas aleatoriamente (seguindo uma normal), de "talento", simularam uma carreira de 40 anos. A cada seis meses, cada pessoa é exposta, também aleatoriamente, a eventos de sorte ou azar, que, respectivamente, dobram ou reduzem pela metade, como proporção ao talento, uma medida de sucesso (também configurada inicialmente com 10 unidades). 


Passados os 40 anos, eis os resultados: primeiro, a distribuição de sucesso deixa de ser normal (concentrada em torno da média e com poucos resultados muito divergentes) e passa a seguir uma lei de Pareto, com alta desigualdade (ver a figura abaixo). Menos de metade da população termina com mais que os 10 "sucessos" iniciais, e os 20 indivíduos mais bem-sucedidos concentram 44% do sucesso total. Segundo, como nas simulações de Frank, raramente os mais talentosos terminam melhor. O acaso atropela as condições iniciais com frequência.

Pluchino, Biondo e Rapisarda ainda fazem outros simulações para avaliar a eficiência de diversas estratégias de financiamento e a influência do ambiente em termos de oportunidades para os indivíduos, também com resultados interessantes, mas não quero me alongar (mais) aqui. Minha conclusão é que, sobretudo em ambientes complexos e altamente competitivos, onde muitas pessoas qualificadas disputam algo, devemos aplicar uma alta dose de compaixão. A diferença entre quem é lembrado e quem é esquecido e deixado para trás pode ser nada mais que um atraso por conta do trânsito, uma dor de estômago, uma briga com o marido, uma chuva que fez um avião não decolar na hora esperada, uma folha de respostas de vestibular perdida num assalto.

quinta-feira, 8 de março de 2018

Faz sentido pensar em auditoria da dívida?

São Tufte chora
Só pra começar o ano por aqui e requentar um texto que saiu no ano passado no Acredito e no Brasil Economia e Governo. Logo volto.