sexta-feira, 20 de abril de 2012

Um anexo para os fatos subversivos sobre crescimento

Update (2/Maio): não deixe de ver uma atualização de alguns dados deste post (Argentina...) aqui.

Das discussões nos comentários, peguei dois pontos para completar:

1. Dados - é natural a desconfiança quanto a qualquer coisa calculada pelos órgãos oficais de estatística argentinos; daí muita gente perguntar se, por acaso, os dados de crescimento não estariam inflados. Replico uma resposta que dei lá:

Os dados da Argentina são da base do Banco Mundial, que por sua vez os recebe dos órgãos oficiais argentinos. Quando a The Economist decidiu parar de publicar dados oficiais da Argentina (http://www.economist.com/node/21548229), o problema era com a inflação, não chegaram a citar alguma desconfiança específica com os dados de atividade - e eu também não lembro de nenhum economista independente do governo apontar alguma diferença entre as estimativas de PIB que faz e o que o governo publica. Há algum tempo li algo falando dos problemas com o deflator do PIB, mas, de novo, não vi ninguém apontando que os dados de crescimento real não são críveis - se acharem algo dizendo o contrário, coloquem aqui, por favor. Pensando um pouco, se a diferença entre o deflator do PIB usado e a inflação real fosse tão grande quanto o gap entre a inflação do INDEC e a medida por outros observadores, o PIB real "corrigido" dos últimos anos implicaria que o país está numa gigante recessão, o que não parece ser o caso olhando para o anedótico e alguns outros dados.
O câmbio semi-fixo aparentemente faz com que o peso fique artificialmente subvalorizado - creio que um câmbio de mercado melhoraria os dados em USD correntes. Em vários estudos de PPP que vi o peso argentino sempre aparece entre as moedas mais subvalorizadas (mas isso muda rápido na medida em que a inflação vai acelerando e o câmbio fixado pelo BC é mais ou menos o mesmo há algum tempo).

Fiz também essa comparação entre o IPC calculado pelo INDEC e o deflator do PIB durante a dinastia Kirchner, acho que o gráfico fala por si só (parece claro quando a Mano de Dios começou a agir no IPC):


2. Alguns leitores pediram para incluir o México na comparação. Na preguiça de fazer arquivos com cada uma das figuras e colar aqui, aí embaixo está um pdf com todos os dados. Em 30 anos, o crescimento do México é bem próximo aos de Brasil e Argentina, mas é clara uma desaceleração com relação a América do Sul cujo início coincide com a crise nos EUA. A subversão aqui é que o NAFTA pode não ter sido um grande negócio para o México.

9 comentários:

Anônimo disse...

"A subversão aqui é que o NAFTA pode não ter sido um grande negócio para o México."
Are you kidding me? Pq o tratado de livre comércio dos EUA com Chile, Coréia do Sul e Colômbia geraram tanto crescimento nesses países e com o México teria sido diferente?
Sem a recessão nos EUA, o México só ficaria atrás do Chile. Mas mesmo assim, em breve passará todos os países desenvolvimentistas, é coisa de 5 anos. O Brasil já arregalou os olhinhos para a competitividade da indústria automobilística mexicana este ano.
Quando estive no México só vi carrão nas ruas, muito parecido com o que vi no Chile. Montes de audis e BMWs pelas rua. Fatalmente superará o Brasil em per capita nominal (se é que já não superou).

Drunkeynesian disse...

Aguardemos os 5 anos. A recuperação do México depende da dos EUA, que até concordo que vai ocorrer, só não sei se nesse espaço de tempo. Em termos de PIB per capita em US$ correntes, as grandezas são parecidas, acabam variando ao longo de pouco tempo mais em função do câmbio do que de qualquer outra variável (câmbio pode variar 20% em um ano, crescimento, não). Se tudo isso quer dizer que o México vai conseguir escapar da tal "middle income trap", é outra história, muito mais complicada.

Quanto aos carrões... andando pelo Itaim ou Leblon você também vai ver montes de Audis, BMWs, Porsches, etc (e um dos lugares onde vi mais Ferrari na vida foi em Miraflores, Lima). Pra contrastar, uma das minhas lembranças do México é um monte de fuscas-táxi, caindo aos pedaços.

Drunkeynesian disse...

Completando: acho que o risco pro México na história do NAFTA é acabar sendo muito influenciada por um tipo de política econômica que pode servir para país rico (EUA), mas antes do próprio México enriquecer. O mesmo vale para os países mais pobres que entrara ma União Europeia (Romênia, Bulgária, Polônia, etc).

Anônimo disse...

Acho que vai acontecer com o México o mesmo que ocorreu com Portugal, Rep. Checa, Espanha ou Irlanda nos anos 80 e 90. Eu disse 5 anos pq esses países não levaram mais de 10 anos para se tornarem desenvolvidos, e em 2012 o processo andaria de forma ainda mais veloz.
México e Portugal eram países bastante semelhantes nos anos 70, inclusive. Após aderir ao livre comércio, Portugal se desenvolveu de forma avassaladora. E muitos portugueses estavam desconfiadíssimos na época também, achavam que Portugal seria prejudicado e que os "ricos do Norte" tirariam vantagem dos "oprimidos do Sul). Hoje sabemos que ocorreu absolutamente o contrário, Portugal ou Irlanda ganharam muito mais ao aderir ao bloco comum do que a Alemanha ou França com a entrada deles.
Claro que o Nafta não repassa verbas como a UE, mas o livre comércio realmente pode alterar a trajetória de países.
Imagine o impacto que o PIB do Brasil teria ao podermos comprar máquinas, veículos e computadores ao preço que são vendidos nos EUA? O PIB decolaria! "Ah, mas as indústria instaladas no Brasil não vão conseguir competir?" Uai! baixem os impostos para elas, então, de forma que se tornem competitivas! Modernizem a CLT! "Ah, isso não dá para fazer, os sindicatos e petralhas vão ficar tristes!" Então deixa quebrar essa merda toda. Não é por causa de meia dúzia de indústria (estrangeiras) em solo brasileiro e sindicatos obsoletos que você vai travar o crescimento de um país inteiro...

Anônimo disse...

Se o EUA oferecer ao México um livre-comércio como Portugal teve na Euorpa... leia-se, qualquer mexicano poder entrar e sair a hora que quiser, morar e trabalhar livremente nos EUA, aí veremos convergência.

Enquanto "livre-comércio" vale pra todos menos pra quem precisa vender sua força de trabalho, não é tão trivial.

Anônimo disse...

Inevitavelmente você precisa da correção por algum índice de preços. O que é que nego usa na hora de calcular o deflator?

Drunkeynesian disse...

O deflator é obtido calculando o valor do PIB a preços constantes e descontando esse valor do PIB nominal - daí obtem-se uma medida média de quanto os preços de todos os bens e serviços usados no cálculo do agregado variaram de um período para o outro. Em países "normais", o deflator se aproxima das medidas de inflação ao consumidor (IPC); na Argentina, como claramente o IPC é manipulado, é fácil observar esse descolamento entre as duas medidas de variação de preços.

Anônimo disse...

Então o cálculo vem de uma matriz inteira com os preços dos produtos finais da economia? Eu sei o cálculo dos índices (e.g paasche, que é o caso) em teoria, mas realmente não sabia como o troço era calculado de verdade.

É estranho -- e grosseiro -- como o governo argentino tem a manha de publicar duas coisas obviamente conflitantes assim. Mas, hein, uma implicância do que você disse no texto é de que talvez os índices alternativos não sejam tão bons assim também -- certo?

Drunkeynesian disse...

Exato - incrivelmente toda essa matemática de índices tem aplicação prática :-)

Quanto aos índices da Argentina: o IPC oficial (calculado pelo INDEC) é sabidamente manipulado; o deflator do PIB parece ser mais confiável (mas ainda vem da mesma fonte que o IPC); e os demais índices, calculados por fontes particulares, são tão bons quanto as reputações de quem os calcula. A The Economist, em cujo critério eu confio, está usando um índice calculado pelo PriceStats, que aponta a inflação real a 24% ao ano (contra 10% oficiais).