Quando soube que eu tinha sido convidado para o Encontro Nacional dos Blogueiros de Economia, uma grande amiga (que também me apresentou recentemente ao pitoresco adjetivo comezinho), empolgada com a ideia, lembrou de uma passagem engraçada de Budapeste, do Chico Buarque: o encontro de escritores anônimos do qual o protagonista participa, em Istambul. No congresso fictício, os ghostwriters liam passagens que haviam escrito para a posteridade alheia e se aplaudiam, emocionados.
Só entendi direito a pertinência da comparação após o evento, depois de a Brahma Extra gelada ter lavado as eventuais introspecções (a deste escriba, sobretudo). Que não me entendam mal os organizadores do evento, Cristiano e Shikida, que foram impecáveis - grandes anfitriões, gastaram tempo e energia na organização e divulgação, devem ter tido um trabalho imenso para conseguir os convidados, conciliar todas as agendas, etc. Nem o público de BH, que manteve o auditório cheio na maior parte das quase cinco horas de evento. Tampouco os convidados - ainda que eu tenha, como no ano passado, sentido a falta de mais diversidade entre as ideias e os participantes, os painéis foram apropriados e interessantes, assim como a participação dos ouvintes. Ocorre que, hoje e no Brasil, a atividade de blogueiro de economia guarda não poucas semelhanças com a de escritor anônimo (mesmo para quem, ao contrário de mim, assina seus textos). Como os escritores anônimos, os blogueiros, com raras exceções, são pouco conhecidos fora do seu nicho. Têm como motivação, com o perdão da generalização, a satisfação de ver suas palavras publicadas e, em segundo plano, algum benefício indireto dessa exposição, ao menos o reconhecimento entre seus pares. E, como na ficção, divertem-se entre si, lembram de eventos passados e piadas internas e isso é somado na tal motivação.
É claro que todos esperamos que, como o rúgbi, um dia isso ainda seja grande no Brasil, e que tenhamos debates relevantes na blogosfera e esta influindo e interagindo com a imprensa, os players de mercado e Brasília. Como para tantas outras coisas, o exemplo está nos EUA, onde mais de um Nobel publica em blog com regularidade (os maldosos de plantão vão dizer, não sem razão, que precisamos, primeiro, de pelo menos um Nobel tupiniquim) e a consulta à ferramenta é quase obrigatória para se atualizar do que se passa nas fronteiras da prática e teoria de economia e finanças. Como confirmariam os colegas, é tudo uma questão de incentivos: por lá, há um público grande e interessado e os benefícios da exposição são muito mais evidentes, haja visto a notoriedade que alguns profissionais alcançaram quase exclusivamente pelo o que defendem nos blogs e a quantidade de veículos de imprensa que contam com blogueiros profissionais e (suponho) bem remunerados. Por aqui, a verdade é que o blog relacionado à economia mais visitado do país muito provavelmente é o do Luis Nassif. Lidemos com isso, por enquanto.
Aplicada a dose de realidade, é de se reconhecer que, por definição, nenhuma história começa sem pioneiros. Torço muito (até por interesse próprio) para que, daqui a alguns anos, esses primeiros encontros tenham evoluído para um fórum de importância nacional, com o devido crédito para seus criadores e entusiastas de primeira leva. Enquanto isso, sigamos tomando nossa cerveja, dando risada de mantegadas e outras barbaridades e nos bastando em nossa doce quixotice. Até Vitória, sede, em 2013, do III ENBECO.
P.S. Odeio os termos "blogueiro" e "blogosfera", uso-os na falta de sinônimos melhores. Vou ali ler umas 10 páginas de Eça de Queirós pra curar.
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4 comentários:
São só impressões.
Lá no norte, apesar desses tempos de mais radicalizações, a diversidade e o intercâmbio parecem maiores. Talvez uma aceitação de que todos são cronistas da sua especialidade não importando onde escrevam, se no jornal ou no blog.
Já aqui a dicotomia parece mais ferrenha. Com o agravante de que se você não reza pela mesma cartilha será propositadamente ignorado.
São raríssimas as citações feitas pela imprensa tradicional de textos produzidos em blogs. Já são parcimoniosos com os concorrentes tradicionais. Mais ainda com o que consideram a grande ameaça.
Não querem informar bem. Querem informar somente com aquilo que produzem.
Voce não terá o mesmo final de Zsoze Kósta; fique tranquilo.
Sucesso a todos!
Existe bloguista? Você deveria usar bloguista...
Hahaha, boa... soa melhor.
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